Afinal, até onde o protecionismo de Donald Trump vai afetar ou impactar as relações do agronegócio dos Estados Unidos e do Brasil no mercado internacional? Produtores, associações de produtores e outras entidades norte-americanas ligadas ao setor criticam e até condenam as ações e decisões do novo presidente em relação à economia agrícola. O fim do TTP, por exemplo, o TransPacific Partnership (Acordo Transpacífico), apesar de não impor restrições, deixa o país menos competitivo no comércio mundial de grãos, carnes e cereais. Isso porque o fim do acordo elimina uma série de benefícios mútuos entre os Estados Unidos e os países participantes do bloco no ambiente do comércio internacional.
Sem o TTP, o agronegócio globalizado vive uma nova abertura comercial. Um novo tempo, de renovação e de novas chances e oportunidades em um mercado altamente competitivo e agora mais protecionista. A resposta do mundo, pelo menos do agronegócio, também será protecionista. Seja com novos blocos comerciais, para fazer frente à política Trump, ou então ressuscitar, celebrar ou impor acordos bilaterais. Inclusive na América do Sul. Para quem achava que o bloco comercial sul-americano estava acabado, esta talvez seja uma nova chance ao Mercosul, pelo menos no que diz respeito à produção, à oferta e demanda de produtos primários e derivados que vêm do campo.
Não apenas o Brasil, como Argentina, Bolívia, Uruguai e Paraguai, que nos últimos anos tem sido o protagonista na América do Sul, têm potencial para sair fortalecido desse novo cenário. Um ambiente macroeconômico agrícola que mexe com relações políticas e comerciais de Brasil e EUA, os dois maiores players do lado da oferta mundial de alimentos e energia. Mesmo não sendo a melhor opção, os acordos bilaterais voltam ao jogo. Talvez seja a motivação que faltava para fortalecer e reorganizar o grupo do Cone Sul, o maior fornecedor mundial de proteína animal e de soja, a proteína vegetal com maior liquidez no planeta.
A abertura comercial consequência do fim do TTP não significa, necessariamente, que vamos aumentar nossas exportações para os países que integravam o acordo. Ou para os EUA, que unilateralmente colocou no chão o tratado. E nem mesmo que vamos diminuir nossa dependência da China ou da Ásia. Daqui para frente, tudo isso pode ocorrer, a depender da estratégica política-comercial a ser adotada pelo país. Só é preciso entender, de uma vez por todas, que a Ásia continuará sendo o maior parceiro comercial do agronegócio.
Não tem a ver com dependência ou não deste ou daquele mercado. A questão aqui é escala. Se vendemos mais para a China, não é porque há um acordo comercial de benefícios e cooperação. Mas simplesmente porque lideramos boa parte da oferta e eles da demanda. E isso não vai mudar. É uma relação de quem produz e de quem consome. O que não significa que não devemos ser mais eficientes e buscar uma relação comercialmente mais equilibrada com a Ásia.
Países como a China dependem muito mais do Brasil e da América do Sul. Mais do que dos Estados Unidos. Das quase 80 milhões de toneladas de soja que o país asiático compra anualmente no mercado internacional, 30% vêm dos Estados Unidos e 60% da América do Sul, dos quais mais da metade do Brasil. Essa proporção pode mudar? Acredito que sim. Não por uma ação de retaliação aos EUA, até porque a China não fazia parte do TPP. Mas porque o Brasil e América do Sul podem ampliar e diversificar seus clientes entre os países antes atendidos pelo TPP.
Na prática, a China terá mais concorrentes na disputa pela produção e oferta sul-americana. Em um ambiente de poucos fornecedores e oferta ajustada à demanda, isso pode fazer toda a diferença. De repente pode ser a hora de impor à China uma cota compulsória de produto com valor adicionado, como farelo e óleo, para continuar a exportar a soja em grão. É a busca de maior competitividade não apenas na produção, como no mercado. Mas este é somente um exemplo das oportunidades que se abrem. É possível fazer muito mais, com o milho, as carnes, o açúcar e álcool. Contudo, de nada adianta um ambiente favorável se não houver investimento e política comercial coerente e apropriada.
A nova política comercial dos Estados Unidos pode sim beneficiar o agronegócio do Brasil e a América do Sul. Como na política e na economia mundial, mesmo que de forma indireta, Trump representa um novo ciclo no agronegócio globalizado. Um tempo de incertezas, mas também de oportunidades, onde não basta ser o maior e sim o melhor. Porque com ou sem Trump o agronegócio continuará sendo um dos mercados mais competitivos e com maior liquidez na economia mundial.
E depois, insana ou não, a estratégia de Trump não tem a ver com o agro. É muito maior e vai muito além do campo. Até porque, o novo presidente não parece estar muito preocupado com o agronegócio, que representa menos de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. A título de comparação, no Brasil o setor responde por quase ¼ da economia nacional.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura