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A mais recente pesquisa de opinião, da CNT/Sensus, mostrou que o presidente Lula foi bem sucedido na blindagem que separou o governo da crise desencadeada pelas denúncias de corrupção nos Correios e no Parlamento. Ao se distanciar de figuras afetadas pelas denúncias, mediante afastamento de ministros e assessores colocados sob suspeição, o Palácio do Planalto conseguiu passar para a opinião pública a percepção de que a crise se restringe ao sistema político-partidário, abrangendo desde o PT até congressistas, mas sem atingir diretamente o presidente da República.

Essa evidência torna urgente, para os líderes do Congresso, a aprovação da reforma política, ao lado da reformulação das CPIs em curso. Em vez do arrastado procedimento de dissecação das operações administrativas dos Correios – de cobertura enfadonha pela mídia –, os parlamentares devem organizar inquéritos objetivos, que alcancem denúncias associadas ao exercício do mandato, punindo os envolvidos de forma exemplar. Manter o "lenga-lenga" das inquirições em curso só favorecerá o Executivo, que se blinda transferindo o fardo das irregularidades para o Congresso.

Em paralelo e como desdobramento de uma investigação expedita e inteligente, o Congresso deve assumir a reforma política contida em projeto já em condição de subir para o plenário. As principais mudanças previstas na proposição n.º 2.679 são a fidelidade partidária, a manutenção da cláusula de barreira e a votação de deputados em lista – conforme explica seu relator, deputado Ronaldo Caiado. O Congresso precisa trabalhar sem subterfúgios nessa matéria, porque só terá dois meses de prazo, até setembro, para que os novos dispositivos possam vigorar na eleição de 2006.

Em paralelo, cumpre deixar de lado casuísmos como a tentativa de revogar o princípio da reeleição de mandatários executivos (presidente, governadores e prefeitos), que traem nossa cultura ainda em amadurecimento. Como registramos em editorial anterior, tal instituto pode e deve ser aperfeiçoado (por exemplo, com afastamento do titular num período prévio antes do pleito), mas precisa ser mantido até passar pela prova do tempo. Nesse sentido foi oportuna a decisão do PSDB de se dissociar de manobras tendentes a propor o fim da reeleição.

Mais, ao promover uma arrumação do quadro político-partidário a reforma reforçará partidos com identidade definida e preservará legendas consolidadas pelo teste das urnas. Mesmo o PT – cujo papel de mediador entre os movimentos sociais e o estamento governamental foi destacado pelo seu novo presidente, Tarso Genro – poderá superar a crise atual a partir da postura, aberta e pluralista da sua nova direção.

O fundamental é que tanto a pesquisa sobre a popularidade presidencial quanto o comportamento da economia indicam o vigor da democracia no Brasil: nos últimos anos diversos aperfeiçoamentos reforçaram os fundamentos econômicos – Lei de Responsabilidade Fiscal, controle da lavagem de dinheiro, autonomia operacional do Banco Central –, além da existência de outras leis e mecanismos que favorecem a opção pela modernidade democrática. A institucionalização de procedimentos legais nas operações policiais sob supervisão do Ministério da Justiça – assegurada pelo seu titular após protestos contra excessos, partidos da Ordem dos Advogados, órgãos da imprensa e Oposição no Congresso – impede retrocessos, validando entre nós o arcabouço democrático do Estado de Direito.

A partir daí não se pode classificar o Brasil entre os Estados fragilizados, estudados pelo pensador Francis Fukuyama, ou entre os Estados imaginários, que Eric Baudelaire e Dov Lynch listam como vítimas destes tempos de globalização. Nesse aspecto concordamos com o historiador Boris Fausto, no seu otimismo quanto ao futuro brasileiro. O país amadureceu com a crise; cabendo evocar sábios do passado, como Montesquieu e Rousseau, que buscaram os fundamentos da República na observância da lei e na virtude dos cidadãos.

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