Joaquim Barbosa exacerbou a forma de expor suas opiniões e por isso perdeu uma oportunidade de colaborar para o resgate da serenidade e do respeito que deve vigorar no convívio das instituições republicanas
Conhecido pela franqueza com que expõe seus pensamentos, a ponto mesmo de dirigir expressões grosseiras a colegas magistrados, advogados e jornalistas, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, ultrapassou agora os limites da convivência harmônica que deve imperar entre os poderes da República ao tecer críticas, de modo inapropriado e genérico, ao Congresso, aos parlamentares e aos partidos políticos.
Segundo ele, em palestra que proferiu numa universidade brasiliense na última segunda-feira, "nós temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com os partidos que nos representam no Congresso, a não ser em casos excepcionais. Eu diria que o grosso dos brasileiros não vê consistência ideológica e programática em nenhum dos partidos. E nem pouco seus partidos e os seus líderes partidários têm interesse em ter consistência programática ou ideológica. Querem o poder pelo poder".
Mais ainda afirmou o presidente do Supremo: "O problema crucial brasileiro, a debilidade mais grave do Congresso brasileiro é que ele é inteiramente dominado pelo Poder Executivo. [...] Temos um órgão de representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição lhe atribui, que é o poder de legislar".
Quanto ao conteúdo da manifestação do ministro Joaquim Barbosa, suas afirmações, sem dúvida, coincidem com o sentimento da opinião pública. E exatamente porque detém o dom de expressar com clareza o pensamento consensual da sociedade, é que o ministro conquistou a admiração popular, a ponto, até, de ser seguidamente citado como o "presidente ideal" de que o país careceria. Ao que parece, os elogios por sua postura enérgica como relator do processo do mensalão serviram-lhe para revesti-lo de méritos para obter prévia indulgência em relação aos excessos que seguidamente comete.
Entretanto, mesmo que suas declarações reflitam o que pensa a maior parte da população, o ministro Joaquim Barbosa extrapolou os limites que a liturgia do cargo lhe impõe. Não importa se, no momento da conferência, manifestava-se apenas como professor ou cidadão dotado dos direitos constitucionais para livre expressão dos pensamentos. O que importa é que, em público e para o público, a toga de que está investido como presidente de um dos três Poderes da República deve servir-lhe de medida para suas palavras e opiniões.
Vive-se nos últimos tempos um período de frequentes choques entre os poderes uns pretendendo limitar as prerrogativas dos demais, como se viu em recentes iniciativas legislativas e decisões judiciais que os puseram em declarada oposição e os expuseram a críticas mútuas. Decididamente, tal embate não convém nem é apropriado quando se trata de cumprir o preceito constitucional da independência e da harmonia entre os poderes e, muito menos, contribui para o aprimoramento da democracia.
O ministro Joaquim Barbosa exacerbou a forma de expor suas opiniões e por isso perdeu uma oportunidade de colaborar para o resgate da serenidade e do respeito que deve vigorar no convívio das instituições republicanas.