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Paulo Briguet

Derrubando florestas e prefeitos

Monteiro Lobato: polêmica sobre termos supostamente racistas | Reprodução
Monteiro Lobato: polêmica sobre termos supostamente racistas (Foto: Reprodução)

Confesso que nunca fui um grande apreciador de hinos. Aprendi as letras de várias canções pátrias durante a infância, nas extintas aulas de Educação Moral e Cívica, mas meu pai era contra a ditadura militar. Prevaleceu, então, certa esquizofrenia musical: na escola, eu ouvia o Hino à Bandeira; em casa, canções republicanas da Guerra Civil Espanhola. Mesmo durante o período de esquerdismo juvenil, a Marselhesa e a Internacional me incomodavam por lembrar guilhotinas, fuzilamentos e gulags. E ufanismo – patriótico ou ideológico – sempre me pareceu jeca. Melhor ouvir as cantatas de João Sebastião Bach.

Mas há uma exceção. Nos últimos tempos, quando ouço o Hino a Londrina, me dá um nó na garganta, os olhos ficam marejados, preciso controlar a emoção. Sentimentalismo de meia-idade? Talvez. Não sei se é a música de Andrea Nuzzi, não sei se é a letra de Francisco Pereira Almeida Júnior, não sei se é a sequência de escândalos no poder público: o fato é que o Hino a Londrina me faz chorar. Uma estranha mistura de tristeza, vergonha e orgulho.

Tristeza porque a Londrina que eu amo vai se transformando, dia a dia, em memória e fantasma. Vergonha por tudo que os políticos têm feito com a cidade ao longo dos últimos anos. E orgulho porque, apesar de tudo, a cidade cresce e se desenvolve. Meu filho nasceu aqui, minha mãe morreu aqui – dois motivos mais que suficientes para amar uma cidade.

Por favor, não me acusem de bairrismo. Eu sei que Curitiba, por exemplo, é uma cidade muito melhor que Londrina. Mas acho que eu não sou bom o suficiente para morar na capital. A caipirice está em minhas veias, em minha alma. Sujei os pés de terra vermelha e a cor nunca mais saiu. Sou jeca a ponto de achar que os primeiros versos do Hino a Londrina foram feitos para mim: "Londrina! Cidade de braços abertos / A todos os filhos do nosso Brasil! / E a todos aqueles de pátrias distantes / Que aqui confiantes, / Sob um pálio anil, / Seu lar construíram e aos filhos se uniram / E aos filhos se uniram do nosso Brasil!"

O João das Águas – ele também um apreciador do Hino a Londrina – diz que a cidade é cortada por 84 rios. Imagine: 84 rios! Um deles é o Córrego Água Fresca, do qual fui vizinho durante muitos anos e cujo nome só vim a saber depois de velho. Imagino que tanta água seja suficiente para fazer uma limpeza na prefeitura maculada por tantos escândalos (escândalos que não vêm de hoje e desconhecem fronteiras partidárias).

O Hino a Londrina é tão interessante que chega a ter um verso politicamente incorreto: "Londrina das matas e das derrubadas". Sei que meus amigos ambientalistas não gostam da passagem, mas um hino não apenas deve ser justo e belo, como também verdadeiro – e, para construir a cidade, foi necessário derrubar florestas.

Há ainda um trecho que define a nossa peculiar incapacidade de suportar populistas e demagogos (mesmo que sejamos pródigos em elegê-los): "Porém, destemida, se os brios lhe ofuscam, / Sói ser atrevida, impávida, hostil". Talvez esses versos expliquem por que derrubamos não apenas florestas, mas também prefeitos. É que a cidade precisa crescer.

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