Muito engenhosa a manobra dos aliados do governo para adiar para 2013 a discussão sobre o destino dos royalties do petróleo. Os ânimos exaltados ficariam arrefecidos e, sobretudo, poupar-se-ia José Sarney de presidir um oneroso veto do Congresso a uma decisão da presidente Dilma Rousseff sobre o destino dos royalties da exploração do petróleo.

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A ideia está sendo costurada em Brasília, mas tem aquele sabor latino-americano de salvar as aparências: a presidente viajará ao exterior no dia 12; seu vice, Michel Temer, também se ausentaria, o mesmo acontecendo com o substituto na linha de sucessão, Marco Maia, presidente da Câmara, forçado a cumprir um compromisso no país centro-americano que se tornou sinônimo de escândalos, o Panamá. Então, Sarney assumiria novamente a Presidência da República, deixaria o cargo de chefe do Legislativo e, assim, ficaria aberto o caminho para contornar a ameaça de um veto presidencial que exige a maioria absoluta das duas casas do Congresso. De quebra, uma homenagem ao mestre dos jeitinhos e trambiquinhos, o líder civil da ditadura militar que a morte de Tancredo Neves converteu em democrata.

Nota dez como artimanha política, nota zero em matéria de respeitabilidade. Numa democracia autêntica, não se brinca com o cargo máximo da República. A chefia da Nação contém uma carga simbólica e moral que não pode ser maculada com ardis criativos, inocentes, porém indignos. Este troca-troca já ocorreu na era FHC para lustrar egos e candidaturas – foi muito criticado.

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O jeitinho é inofensivo, não constitui infração, mas ele não existe isolado; é um processo contínuo, dinâmico, que começa com insignificâncias e pode terminar num mensalão. Se o vice-presidente da República, Michel Temer, presidente licenciado do PMDB, não tem competência para contornar um impasse político, o que está fazendo como tutor do maior aliado do governo?

A presidente Dilma Rousseff precisa ser ajudada, está visivelmente empenhada em espanar qualquer indício de suspeição capaz de impregnar atos e intenções do governo. Este troca-troca com a faixa presidencial não combina com o seu feitio franco e sua lhaneza. A lógica que adotou para preservar direitos dos estados produtores de petróleo é correta, salomônica, assegura os direitos dos estados produtores em contratos já licitados. Dilma saberia vencer as resistências de parlamentares que não enxergam a necessidade de manter a coesão nacional.

É preciso recusar todas as tentações do jeitinho porque invariavelmente conduzem a situações com jeitão de malfeitoria. Um acertinho irrelevante acomodou uma série de interesses pessoais que acabaram entranhados no vergonhoso conluio que pela primeira vez alcança a Advocacia-Geral da União, felizmente desbaratado pela Operação Porto Seguro da Polícia Federal.

Um convite irrecusável, inócuo, no máximo maroto, produziu a insólita quadrilha formada por 64 policiais-militares do 15.º BPM em Caxias, estado do Rio. Agentes da lei, pagos para proteger o cidadão, não poderiam estar a serviço do crime. Estavam e não se deram conta disso. A leniência com a improbidade e a impunidade se articulam justamente na esfera nanica, microscópica, onde os contornos e teores são imperceptíveis, facilmente disfarçáveis. Sarney novamente na Presidência da República deixa de ser um capricho do destino para tornar-se uma reincidência que compromete nossa capacidade de fazer política.

Alberto Dines é jornalista.

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