O Brasil termina 2017 melhor do que estava no fim de 2016, sem dúvida alguma. Ainda que os indicadores econômicos do ano ainda não estejam fechados, já se sabe que a inflação será bem mais baixa que os 6,29% de 2016 – é provável que o presidente do Banco Central tenha de escrever uma carta ao ministro da Fazenda explicando por que o IPCA ficou abaixo do piso da meta de inflação do ano. A taxa básica de juros, a Selic, caiu quase pela metade, passando de 13,75% para 7% ao ano. Indicadores na indústria e no comércio mostram o início de uma retomada. A decepção, até o momento, está no mercado de trabalho. Por mais que se saiba que, em uma crise, o desemprego é o último indicador a subir e, nas retomadas, é o último a recuar, o recente dado do Caged – 12,3 mil vagas de trabalho cortadas em novembro, o primeiro resultado negativo em sete meses – veio como uma ducha de água fria.
Por mais que as condições para a recuperação estejam aos poucos se encaixando, 2018 será um ano decisivo se Michel Temer quiser entregar ao sucessor um país pronto para aproveitar um crescimento sustentável, de longo prazo, em vez dos já tradicionais voos de galinha que o Brasil ensaia periodicamente. A chave para isso está na aprovação das reformas que ficaram para o novo ano, especialmente a da Previdência e a tributária.
A versão atual da reforma da Previdência ainda é muito melhor que a opção de não aprovar reforma nenhuma
Depois de conseguir a aprovação da PEC do teto de gastos, no fim de 2016, o governo parecia suficientemente forte para enfrentar o tema da Previdência. Apesar de a bomba-relógio do sistema previdenciário brasileiro estar montada a olhos vistos, a última alteração substancial tinha sido a introdução do fator previdenciário, no governo Fernando Henrique Cardoso. Ainda assim, era preciso mudar mais, do contrário o único cenário futuro era o da insolvência. Temer teve o mérito de chamar atenção para o assunto e sua proposta parecia prosperar, até que o “furacão Joesley” expôs as fragilidades morais do presidente e mudou o foco do Planalto, que passou a se concentrar na manutenção do mandato presidencial, ameaçado por duas denúncias da Procuradoria-Geral da República. A Previdência teria de esperar – e não deixa de surpreender o fato de o governo ter conseguido, mesmo assim, aprovar a reforma trabalhista em julho.
Mas, se Temer conseguiu escapar ileso das denúncias da PGR, o mesmo não se pode dizer da reforma da Previdência. A versão inicial proposta pelo Planalto já foi bastante desfigurada, graças à combinação entre a pressão de determinados setores (que, ainda por cima, têm porta-vozes poderosos na Câmara dos Deputados), o enfraquecimento do presidente (ainda que temporário) e a campanha de desinformação promovida pela oposição. Mesmo em sua versão mitigada, ela não conseguiu apoio parlamentar suficiente para que fosse colocada em votação antes do recesso parlamentar.
Ainda assim, a versão atual da reforma da Previdência é muito melhor que a opção de não aprovar reforma nenhuma e fingir que não existe um problema sério que ameaça as aposentadorias futuras. O fato de o texto deixar de fora algumas categorias bem-sucedidas em sua pressão (que às vezes chegou ao uso da violência), cuja situação terá de ser alvo de uma “reforma da reforma”, não deslegitima a urgência de se aprovar itens como a idade mínima e novas regras para o tempo de contribuição.
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O grande obstáculo a vencer será a tendência ao populismo, em que parlamentares interessados na reeleição buscarão fazer acenos a um eleitorado ainda refratário à reforma, deixando a responsabilidade de lado. Com a Previdência entrando na discussão eleitoral, por outro lado, há a oportunidade de os populistas serem confrontados por adversários com os pés no chão e que saibam tratar o eleitor como adulto, explicando a matemática pela qual o sistema previdenciário brasileiro caminha para o caos.
O outro legado que Temer ainda precisa entregar é a reforma tributária, que tem o potencial de racionalizar o emaranhado que faz do Brasil o país onde mais se gasta tempo para pagar impostos e, principalmente, ao tributar mais a renda e a propriedade em vez da produção e do consumo, pode reduzir a carga que pesa sobre os mais pobres. Por ser uma plataforma mais consensual e cujos benefícios são mais evidentes, não há motivo para que ela não seja levada à apreciação do Congresso Nacional em breve.
O período eleitoral não é motivo para adiar reformas que são essenciais para o país. Esta é a última chance de Michel Temer deixar um legado reformista; que não a desperdice.