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Editorial

A auto-suficiência

O Brasil faz festa. A última sexta-feira, dia em que o Brasil comemorava Tiradentes, foi a data emblematicamente escolhida para o anúncio oficial de que, enfim, fora alcançada a auto-suficiência brasileira na produção de petróleo. O botão que abriu as válvulas da plataforma P-50, no campo de Albacora, Bacia de Campos, de certo modo deu seguimento e maior concretude ao ideário do mártir da nossa Independência, na medida em que livrou o país do grilhão que o mantinha sujeito ao humor politicamente instável do mercado petrolífero mundial.

A partir de agora, a produção diária de 2 milhões de barris está momentaneamente equilibrada em relação ao consumo, culminando a luta iniciada pelo jornalista e escritor Monteiro Lobato na primeira metade do século 20 e empunhada como bandeira por Getúlio Vargas. Deve-se a esse presidente-estadista a criação da Petrobrás, em 1953, e à capacidade técnica que a empresa desenvolveu, ao longo do seu meio século de existência, o alcance do grande sonho brasileiro do "petróleo é nosso".

É justo, pois, comemorar este feito – desde que não seja apropriado, como indisfarçavelmente se tenta fazer, para a promoção política dos atuais governantes. Há, como já frisamos, uma longa história para explicar o explosivo crescimento da produção do petróleo, especialmente a partir do momento em que, sob o governo Geisel, a Petrobrás alcançou invejável competência técnica para extraí-lo de águas profundas; e a partir de 1998 quando, sob o governo Fernando Henrique, a empresa abriu seu capital à participação estrangeira e foi obrigada a tornar-se mais competitiva e mais lucrativa para seus novos e exigentes acionistas.

Desde então, felizmente, a produção passou a aumentar à razão de 7,4% ao ano, muito acima, portanto, da média de crescimento do PIB nacional. No mesmo período, no entanto, o consumo nacional de combustíveis diminuiu em 0,2%! Portanto, além da elevação da produção, a queda na demanda por derivados explica a auto-suficiência. E a queda, por sua vez, se explica pelos baixíssimos índices de crescimento econômico que o país passou a experimentar. O equilíbrio deu-se, pois, por vias transversas.

Diante disso, se há razão para o presidente da República melar as mãos em petróleo para comemorar a auto-suficiência, há razão também para que ele medite sobre este "outro lado" da história, a respeito do qual é também responsável. Isto é, se o país tivesse crescido à média mínima desejável de 5% ao ano, inclusive sob o governo Lula, a auto-suficiência seria adiada por muitos anos ainda.

Como se vê, o ufanismo deve ser contido. Até porque o país tem pela frente o desafio de voltar a crescer a níveis razoáveis mantendo-se ao mesmo tempo a auto-suficiência. Se quiser acompanhar a média mundial, as taxas de PIB precisarão se comportar ao redor de 4% ou 5% por ano – piso que, se a curto prazo não nos tirará da periferia, é o mínimo necessário para atender a demanda por empregos e diminuir a pobreza em que estamos encalacrados.

É lógico que essas condições desejáveis de crescimento econômico implicam a real implementação de uma política energética responsável e conseqüente, tanto na exploração de fontes alternativas quanto na do próprio petróleo. Ou seja, a auto-suficiência deve ser alcançada e comemorada todos os dias.

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