“Travem a batalha da comunicação.” Esse foi o pedido da presidente Dilma Rousseff a seus ministros no fim de janeiro. Ela se referia a um esforço para combater as críticas a suas primeiras ações do segundo mandato, que desmentiam tudo o que tinha sido prometido durante a campanha. Na semana passada, no entanto, duas notícias mostraram que a “batalha da comunicação” se trava também em outras frentes, mais obscuras.

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O jornal O Estado de S.Paulo divulgou, no dia 17, documento interno da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República, comandada pelo paranaense Thomas Traumann. O texto, sem assinatura, é recentíssimo, pois cita a entrevista presidencial do dia 16. Descreve o desânimo nas mídias sociais entre os militantes petistas à medida que Dilma ia adotando medidas que condenava na campanha. A imprensa “tradicional” é mostrada como cúmplice da oposição, o que não chega a ser uma surpresa.

O que surpreende é o grau de franqueza com que o documento descreve a relação entre o Palácio do Planalto e a chamada “blogosfera progressista”, apelido dos sites chapa-branca especializados na defesa do governo. “As ações das páginas do governo e das forças políticas que apoiam Dilma precisam ser muito melhor coordenadas e com missões claras. É natural que o governo (...) tenha uma comunicação mais conservadora, centrada na divulgação de conteúdos e dados oficiais. A guerrilha política precisa ter munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele”, diz o documento da Secom.

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Fica escancarada a cumplicidade entre a instituição Presidência da República e a militância virtual: o governo “fornece munição” para que os blogueiros “disparem”. Essa relação chegou até mesmo a passar por estremecimentos no início do primeiro mandato de Dilma, relata o texto, graças ao “fim do diálogo com os blogues pela Secom”. O “diálogo”, cujo funcionamento não é explicado no texto, “só foi plenamente restabelecido durante a campanha eleitoral de 2014”. É preciso lembrar que vieram justamente desses sites alguns dos ataques mais grosseiros – e que devem ter deixado muitos simpatizantes do PT indignados – contra aqueles que o partido vê como inimigos, incluindo ofensas racistas contra Joaquim Barbosa e tentativas de desmoralizar o juiz federal Sérgio Moro. São também esses sites os destinatários de generosas verbas de estatais, que o jornalista da Folha de S.Paulo Fernando Rodrigues descobriu serem completamente desproporcionais à sua audiência.

Rui Falcão revela sua compreensão do que sejam as verbas governamentais de publicidade: não um instrumento para cumprir um preceito constitucional, mas uma arma de chantagem para coibir a crítica

Outra estratégia para ganhar a “batalha da comunicação” inclui “consolidar o núcleo de comunicação estatal, juntando, numa mesma coordenação, a Voz do Brasil, as páginas de sites, Twitter e Facebook de todos os ministérios, o Facebook da Dilma e a Agência Brasil”, em uma mistura gritante entre o que é partidário e o que é público. O “Facebook da Dilma”, por exemplo, é administrado pelo PT – a informação está na própria descrição da página. Além disso, a Secom afirma que “a publicidade oficial em 2015 deve ser focada em São Paulo (...) Não há como recuperar a imagem do governo Dilma em São Paulo sem ajudar a levantar a popularidade do Haddad”, colocando a máquina federal a serviço de um prefeito petista.

Enquanto isso, o presidente do PT, Rui Falcão, defendia, em reunião fechada com a bancada do partido, “uma nova política de anúncios para os veículos da grande mídia” – leia-se restringir a publicidade em veículos que, segundo Falcão, “apoiaram” e “convocaram” a participação nos protestos do dia 15. Por “apoio”, fique claro, o presidente do PT entende a mera divulgação das passeatas, grandes o suficiente para merecer flashes durante a programação diária.

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Já é suficientemente grave que um dirigente partidário, sem cargo no Executivo, se ache na posição de determinar o que o governo federal deve ou não fazer. Pior ainda é revelar sua compreensão do que sejam as verbas governamentais de publicidade: não um instrumento para cumprir um preceito constitucional, mas uma arma de chantagem para coibir a crítica. Quando o critério para o investimento em publicidade deixa de ser a audiência para ser o alinhamento editorial/ideológico com o governo, desrespeita-se o princípio da impessoalidade e institui-se uma forma sutil de controle de conteúdo que coloca em risco a própria liberdade de imprensa.

De um lado, a sutileza e a sordidez na relação entre governo e blogosfera chapa-branca; de outro, o totalitarismo explícito de Rui Falcão. Os dois casos são expressões diferentes de uma única face autoritária do lulopetismo: o objetivo de controlar a informação no Brasil, seja colocando a máquina de comunicação estatal a serviço do partido, seja desacreditando a imprensa, seja criando mordaças econômicas para evitar críticas. Uma postura de guerrilha (palavra usada inclusive no documento da Secom) que coloca o partido mais perto das ditaduras e mais longe do respeito aos princípios republicanos.