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Editorial 1

A coerência de Obama

O presidente norte-americano Barack Obama está abrindo um novo capítulo da história dos Estados Unidos ao anunciar a retirada das tropas de seu país do Iraque. Até o fim do mês deverão sair os primeiros 90 mil soldados do contingente de ocupação, dando início ao fim de uma guerra que já persiste há sete anos. No entanto, a presença norte-americana naquele país deve durar até 2011, para possibilitar a transição e garantir estabilidade ao seu governo, até que possa andar com as próprias pernas.

Da mesma forma que anunciou, recentemente, que o novo princípio norteador da política nuclear dos Estados Unidos passa a ser o diálogo, Obama pretende influir no futuro do Iraque, como ele mesmo afirmou, cada vez mais com as forças da diplomacia. O presidente não cumpre somente promessas de campanha eleitoral e prazos estabelecidos, mas sim está desmontando uma máquina de guerra que poderia levar a graves consequências para o seu país, como mostram precedentes da história.

A realidade dos fatos aponta essa perspectiva. Em março 2003, os EUA invadiram o Iraque e derrubaram o regime ditatorial de Saddam Hussein. Era por pouco tempo a intervenção militar, mas isso não aconteceu. Os EUA estavam iniciando um conflito que causaria a morte de quase 100 mil pessoas, entre as quais mais de 4 mil soldados de suas forças; ferimentos em outras 30 mil pessoas; gastos superiores a US$ 736 bilhões; e a mobilização de quase um milhão de militares. A continuidade da presença militar dos EUA no Iraque sem prazo definido só poderia agravar esse quadro.

A decisão de Obama ocorre num momento no qual a situação no Iraque parece voltar a se deteriorar. Esse é o risco que corre, mas no horizonte parece que Washington não vê outra saída. Julho foi o mês com mais mortes relacionadas ao conflito em mais de dois anos, segundo números oficiais do governo iraquiano. Ao mesmo tempo, o país árabe encontra-se sem um governo efetivo desde as eleições gerais de março, que terminaram sem um vencedor claro. As diferentes facções políticas do país ainda não conseguiram um acordo para a formação de uma coalizão com solidez.

Embora em circunstâncias bem diferentes, Obama age praticamente com os mesmos fundamentos que motivaram o seu antecessor Richard Nixon (1969-1974) a negociar o fim da guerra do Vietnã, que se concluiu só em 1975, alguns meses depois da sua renúncia, por causa do escândalo de Watergate: a incapacidade militar e política de os EUA acabarem com as divergências internas e, principalmente, com um terrível inimigo invisível; na época, as forças guerrilheiras do regime de Hanói que habitavam as catacumbas e combatiam sem tréguas os soldados invasores e seus aliados; hoje, o odioso terrorismo, que continua ceifando todos os dias a vida de soldados e dezenas de vítimas inocentes. Em relação a um e outro momento histórico, contudo, há uma diferença crucial: Obama está impedindo uma tragédia muito maior.

A dimensão da guerra do Vietnã, que du­­rou 16 anos, causando a morte de três mi­­lhões de vietnamitas (do Norte e do Sul) e 50 mil soldados norte-americanos, obrigou o renitente Nixon, an­­ticomunista ferrenho, a se prostrar aos fatos. Isso depois de um desgaste incomensurável, diante da força da opinião pública norte-americana e internacional. Embora o Iraque corra o risco permanente de convulsão in­­terna, Obama sabe que, se persistir no mes­­mo erro do passado, pode fazer com que o seu país, num futuro breve, enfrente o mes­­mo dilema de Nixon. Com coragem, viu que pode evitar o mesmo erro.

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