Entre os assuntos relevantes estudados pelos cientistas políticos está o tema da "governabilidade". A definição mais simples dessa expressão diz respeito ao quadro de estabilidade política, equilíbrio econômico e tranquilidade social, que se traduz em condições para que o governante seja visto pela população como seu legítimo representante, logo podendo exercer com autoridade e plenitude suas atribuições. Os casos da Síria e da Ucrânia – essa última tendo seu presidente deposto depois de conflitos violentos nas ruas – são mais dois exemplos que entram para a história, mostrando que o chefe de governo que perde a governabilidade acaba por completar seu mandato de forma melancólica: ou renuncia ou é deposto.

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Nem todos os exemplos de falta de governabilidade terminam de forma sangrenta e com deposição do governante. Alguns levam seus mandatos até o fim, como timoneiros de um barco sem rumo, sem liderança e eivado de maus indicadores econômicos e sociais. De certa forma, foi o que aconteceu com o presidente Sarney. Ele foi sustentado no cargo como um governante fraco, cujo mandato lhe caíra nas mãos em razão da morte de Tancredo Neves. Sem condições de fazer reformas, com inflação elevada e frágil em suas decisões, Sarney foi até o fim e passou a faixa presidencial a Fernando Collor. Este, ao perder totalmente a governabilidade, deixou a Presidência no meio de um processo de impeachment.

O governante sábio esmera-se na conquista da confiança da população, pois sabe que sem isso a governabilidade se esvai e sua manutenção no poder acaba ameaçada. Como governante algum deixa o poder tranquilamente, em geral instala-se o caos social com manifestações violentas, como as que têm ocorrido em várias partes do mundo. A presidente Dilma está, neste momento, iniciando o processo de um teste para saber se existe confiança em sua palavra – independentemente de concordância com as medidas de seu governo.

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Quando era chefe da Casa Civil no governo Lula, Dilma Rousseff afirmou que a política de seu colega Antônio Palocci, à época ministro da Fazenda, era "rudimentar", referindo-se ao plano de Palocci de perseguir a austeridade fiscal e a elevação do superávit primário para pagar os juros da dívida pública – e, assim, impedir que o passivo subisse perigosamente. Recentemente, pressionada pelos maus indicadores econômicos e pela constatação da falta de confiança dos agentes econômicos nacionais e internacionais em suas palavras e na ação do governo, a presidente Dilma determinou a seu frágil ministro da Fazenda, Guido Mantega, que anunciasse um corte de R$ 44 bilhões nos gastos do orçamento de 2014, cuja previsão foi reduzida de R$ 1,052 trilhão para R$ 1,008 trilhão.

Guido Mantega é visto pelo mercado como um ministro sem vontade própria, um mero executor das decisões imperiais da presidente da República. Esse corte, se for executado, será bem visto pelos agentes econômicos, mas é considerado insuficiente, porquanto o superávit primário – que já teve a meta de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) – ficará em apenas 1,9% do PIB, bem abaixo do valor necessário para bancar os juros da dívida pública.

Todavia, o problema não está no tamanho do corte. Está na falta de confiança na palavra do governo, que foi construída a partir de alguns ingredientes: baixo crescimento do PIB; inflação elevada; manipulação da contabilidade fiscal; congelamento parcial dos preços de energia, combustíveis e tarifas de transporte; interferência nas empresas estatais; e intervencionismo na economia. Esses ingredientes formaram o prato feito pela presidente Dilma e seu ministro da Fazenda para a queda da credibilidade governamental e estão na base da desconfiança dos agentes econômicos no governo.

A presidente está muito longe de perder a governabilidade, mas há um notório desgaste em sua capacidade de convencer os agentes econômicos de que seu governo fará o que está dizendo. Governabilidade não é algo que se perde de uma vez só; é algo que se desgasta com o tempo e acaba por minar a capacidade do chefe da nação de exercer com eficiência e eficácia suas atribuições. Neste momento, seria bom a presidente Dilma prestar mais atenção aos cientistas políticos – que são estudiosos da arte de governo – que aos marqueteiros bem pagos, especialistas em ganhar eleições.

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