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Editorial

A crise na Ucrânia e o silêncio do Brasil

Quando o presidente de um país se aproxima para cumprimentar o primeiro-ministro de outra nação e ouve como resposta, nestes exatos termos, "Acho que vou apertar sua mão, mas tenho apenas uma coisa para dizer: você tem de cair fora da Ucrânia", é sinal de que a imagem de Vladimir Putin, o líder russo, não é das melhores na comunidade internacional. O responsável pela repreensão foi o canadense Stephen Harper, que apenas expressou de uma maneira mais incisiva a opinião de vários representantes de membros do G20, reunidos na Austrália no último fim de semana.

Barack Obama, por exemplo, também manifestou sua oposição ao que chamou de "agressão da Rússia contra a Ucrânia, uma ameaça para o mundo", citando na sequência a derrubada, em julho, de um avião da Malaysia Airlines que sobrevoava território ucraniano dominado por rebeldes separatistas pró-Rússia. "A situação atual não é satisfatória", disse a chanceler alemã, Angela Merkel, acrescentando que a União Europeia estudava novas sanções contra os russos. "Se ele [Putin] continuar a desestabilizar a Ucrânia, haverá mais sanções", confirmou o primeiro-ministro britânico, David Cameron. A pressão foi tão grande que o presidente russo deixou o encontro do G20 antes do seu encerramento.

O Kremlin ainda hoje nega qualquer envolvimento na crise que começou em fevereiro, com um movimento separatista pró-russo na península da Crimeia – posteriormente anexada pela Rússia, em uma clara violação do Memorando de Budapeste, de 1994, em que a Ucrânia entregou seu arsenal nuclear em troca do respeito à garantia de integridade territorial –, e se alastrou para o leste da Ucrânia. Tanto que a resposta de Putin a Harper no G-20 foi "Isso é impossível porque não estamos lá". A realidade é bem diferente: dias antes do encontro de líderes, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) havia identificado tanques e armamentos russos cruzando a fronteira com a Ucrânia, ameaçando o frágil entendimento obtido pelo Protocolo de Minsk, assinado em setembro.

Apesar de tudo o que vem fazendo na Ucrânia, Putin conta com o apoio, ou pelo menos com o silêncio, de seus parceiros Brics, incluindo o Brasil. Na Austrália, Dilma Rousseff chegou a lamentar que o ministro das Relações Exteriores ucraniano tivesse pedido o apoio e uma posição mais clara do Brasil a respeito da crise na Ucrânia. "Que apoio que ele pede? O Brasil, no caso da Ucrânia, não tem, nunca definiu uma posição. Nunca nos manifestamos e evitamos, sistematicamente, nos envolver em assuntos internos", disse Dilma, esquecendo-se, ou querendo se esquecer, de que, quando se trata de defender seus aliados ideológicos, o Brasil costuma, sim, "se envolver em assuntos internos", como bem sabem hondurenhos e paraguaios.

O Brasil já foi mais incisivo quanto à sua pretensão de ganhar mais espaço no cenário internacional, pleiteando uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Hoje, com sérios problemas internos, como a economia cambaleante e a corrupção persistente, o tema parece ter saído da lista de prioridades. Mas, quando o sonho voltar a se fortalecer, as alianças com ditadores e a omissão diante de crises como a ucraniana certamente retornarão para assombrar a ambição brasileira.

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