“A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas.” A frase é do grande estadista, escritor e inspirado orador Winston Churchill, o primeiro-ministro britânico a cuja força moral a humanidade deve em grande parte a derrota do nazismo, regime sanguinário que, ao lado do comunismo stalinista, assombrou o mundo no século passado. Claro, a democracia é muito melhor do que deixa a entender o pessimismo irônico de Churchill, mas a frase se tornou uma das mais famosas definições do regime caracterizado pelo império da lei e pelo respeito à vontade popular manifestada por seus representantes.
O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, ex-metalúrgico que fez carreira na profissão, não tem a mesma estatura intelectual e política de Churchill, mas também tem sua definição de democracia – um regime, segundo ele, que consiste no “exercício solitário de pensar o que é bom para as pessoas”. O problema é “a grande pulga atrás da orelha” que o está incomodando, pois consolidar essa “democracia” no Brasil ficou muito complicado depois do advento das redes sociais, reclamou na segunda-feira, dia 22.
Para quem fez escola política e ideológica embebendo-se da sabedoria do sindicalista e depois presidente da República Lula, Okamotto certamente se inclui entre os que admiram e defendem as “democracias” cubana e venezuelana. Portanto, não surpreende a afirmação de que as redes sociais “atrapalham o curso da democracia”. Com certeza, na visão de Okamotto, também devem “complicar a democracia” a oposição, a imprensa livre, a Justiça, o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União, a Polícia Federal e o ânimo do juiz Sérgio Moro em desvendar os esquemas de corrupção da Petrobras que financiavam a “democracia” sonhada pelo acólito do ex-presidente.
Na visão de Okamotto, também devem “complicar a democracia” a oposição, a imprensa livre, a Justiça, o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União, a Polícia Federal e o juiz Sérgio Moro
Em suma, para Okamotto a democracia seria melhor se um só pensasse e decidisse por todos; afinal, também o povo vez ou outra “complica a democracia”, quando se atreve a pensar fora da caixinha determinada pela cúpula petista. É exatamente sob este aspecto que as redes sociais preocupam tanto, pois têm poder maior de mobilização das massas do que aquele que um dia parecia ser apanágio apenas do Partido dos Trabalhadores e de sua base sindical. O poder das redes ficou expresso nas manifestações de março e abril, que levaram para as ruas multidões de brasileiros contrários ao governo em quantidades muito maiores do que em qualquer ato convocado pelo PT ou suas entidades-satélites. Culpe-se também o povo?
Inegável que, não faz muito tempo, as esquerdas demonstraram habilidade e capacidade para conquistar simpatias, liderar e organizar manifestações, grupos de pressão e redes de contato muito bem azeitadas que abrangiam setores religiosos, dos sindicatos e de estudantes. Foi esse fenômeno que, num crescendo, eleição após eleição, levou Lula e o PT ao poder. O surgimento e a expansão das mídias sociais, no entanto, deram voz a quem discordava e permitiram que diferentes segmentos da sociedade estabelecessem também ligações uns com os outros. É a elas que se deveu a recente supremacia das oposições nas ruas.
Há um outro fator importante de que poucos se dão conta com a clareza devida: as redes sociais alimentam-se da informação de qualidade produzida pela imprensa. Às vezes distorcem, exageram, criam factoides, mas sem dúvida elas detêm hoje um poder de mobilização que já foi exclusividade dos partidos políticos e das bases sindicais e estudantis. Daí o pânico expressado por Paulo Okamotto e referendado pelo próprio Lula, que pediu a refundação do PT mediante melhor uso (e abuso?) das redes sociais. Vem também daí a ansiedade com que o PT defende o controle social da mídia – eufemismo que utiliza para impor uma regulamentação que, ao fim e ao cabo, levará ao cerceamento das liberdades de expressão e pensamento, a exemplo do que vêm fazendo algumas “democracias” vizinhas, como a Venezuela, a Argentina e o Equador.
A “democracia” que Okamotto e Lula defendem parece consistir exatamente naquilo que complica a verdadeira democracia: no aparelhamento do Estado para colocá-lo a serviço de um partido, na defesa de corruptos condenados, na cumplicidade com ditaduras vizinhas, nas tentativas de tolher as opiniões contrárias. Não é esta democracia a que se referia Churchill. A democracia que querem, diria Okamotto, é a de uns poucos que acreditam ter o poder de pensar e agir em nome de todos.
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