O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, liberou nesta quarta-feira (28) a denúncia contra o presidente da República, Michel Temer, que deve seguir para apreciação da Câmara dos Deputados. No documento, baseado na delação premiada do empresário Joesley Batista, da JBS, a Procuradoria-Geral da República (PGR) acusa o presidente de ter praticado corrupção passiva durante o mandato com “vontade livre e consciente”.
A decisão de Fachin solidifica o entendimento que a denúncia deve ser enfrentada em duas esferas: a política e a jurídica. “A Câmara dos Deputados realiza um juízo predominantemente político de admissibilidade da acusação”, explicou o ministro. Depois desta etapa, ao STF compete um “juízo técnico-jurídico”.
E é na esfera política que a denúncia elaborada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enfrentará seu maior desafio: provar que as acusações são consistentes e não são, em sua maior parte, uma peça política, como acusam alguns críticos, inclusive Temer, que afirmou se tratar apenas de “ilações”.
Primeiro de três denúncias, o inquérito 4.483 traz poucos avanços no que já se sabia até então. Descreve com detalhes como foram os dias entre o início das conversas com representados da JBS até chegar à entrega da mala de dinheiro. Mas faz acusações diretas. “(Temer) recebeu para si, em razão de sua função, em comunhão de ações, unidades de desígnios e por intermédio de Rodrigo Rocha Loures, vantagem indevida de cerca R$ 500.000,00”.
Ao ler a denúncia de cerca de 60 páginas, não se pode confirmar a afirmação da PGR. Em nenhum momento as provas apresentadas demonstram cabalmente que o presidente pediu direta ou indiretamente benefícios ilícitos, como prevê o artigo 317 do Código Penal. Este provavelmente será um dos pontos a serem dissecados pelos deputados. A Lava Jato traz um histórico de denúncias com muito mais qualidade técnica do que a apresentada por Janot, que construiu a peça acusatória com pouco mais de dois meses, uma velocidade muito acima do normal para o órgão.
É importante lembrar que a ação coordenada pela PGR fez uso de ações de campo, grampos e escutas ambientais. Tinha como “parceiro” um dos maiores criminosos do Brasil, com grande tráfego no mundo político e que prometia entregar o presidente da República. Joesley Batista conseguiu gravar conversas pouco republicanas, indicou como funcionava o esquema e negociou uma delação com benefícios inéditos. Também revelou o nome de vários políticos envolvidos. Mesmo assim não conseguiu registrar nenhum diálogo em que o próprio Temer se comprometesse claramente com o pagamento de propina.
A interpretação que Janot dá aos fatos abre brechas para a crítica de que é uma acusação política. Fatos irrefutáveis deveriam se sobrepor a interpretações discutíveis, principalmente quando se está em jogo a figura da Presidência da República.
Mas, caro leitor, não interprete este texto como uma defesa a Temer. A melhor saída, como já detalhada anteriormente neste espaço, é a renúncia com o chamamento para eleições indiretas. Porém, aparentemente não parece ser uma possibilidade real neste momento. Uma denúncia com provas cabais ajudaria o país a superar mais rapidamente a crise política que assola há anos. O Brasil tem pressa para mudar a agenda. Precisa voltar a discutir urgentemente as reformas.
Quanto mais se arrastar a indefinição em torno do futuro de Michel Temer, mais demorada será a retomada do crescimento econômico e da confiança do investidor, e menor será a chance de aprovação da reforma da Previdência, que ainda está em tramitação na Câmara dos Deputados e já recebeu emendas que prejudicam sua eficácia e mantêm privilégios de uns poucos setores, enquanto cobram o sacrifício maior do trabalhador da iniciativa privada.
Um Temer enfraquecido e precisando barganhar apoio parlamentar não conseguirá avanços significativos, até porque estará mais preocupado em salvar a própria pele. E o Brasil, reforça-se, precisa das reformas.
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