Uma incógnita e uma surpresa foram decisivas para a votação, no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, que aprovou o relatório que pede a cassação do presidente afastado da casa, o peemedebista Eduardo Cunha. Tia Eron (PRB-BA), que escondeu seu voto até o último instante, era considerada o fiel da balança: a julgar pela posição declarada pelos demais integrantes do conselho, se ela votasse a favor de Cunha, decidiria o placar pela impunidade; se apoiasse a cassação, empataria tudo, forçando o voto de minerva do presidente da comissão, José Carlos Araújo (PR-BA), considerado contrário a Cunha.
No fim, não apenas Tia Eron votou pela aprovação do relatório de Marcos Rogério (DEM-RO) – ou seja, contra Cunha –, como logo depois dela o paraense Wladimir Costa, do Solidariedade, que havia dito, durante a sessão, que seu partido votaria pela absolvição de Cunha, mudou de posição e apoiou o relatório. Como todos os outros integrantes votaram de acordo com o que já haviam declarado, o placar terminou com 11 a 9 contra Cunha, e nem foi necessário recorrer ao voto de Araújo. Os paranaenses membros do Conselho de Ética se dividiram: Nelson Meurer (PP) ficou ao lado de Cunha, enquanto Sandro Alex (PSD) votou pela cassação.
O placar apertado do Conselho de Ética mostra que não faltam apoiadores a Cunha e seus métodos
Trata-se de um passo inicial, mas necessário para a remoção de uma figura que envergonha a política brasileira. Nesses oito meses e um dia transcorridos desde que o PSol e a Rede protocolaram a representação contra Cunha até a votação desta terça-feira, ele e sua tropa de choque usaram todos os meios possíveis para postergar a decisão ou constranger os deputados do Conselho de Ética, incluindo até a pesquisa sobre informações que pudessem prejudicar aqueles que já haviam se declarado favoráveis à cassação.
Nesse meio tempo, Cunha foi cortejado tanto pelo governo quanto pela oposição, tudo por causa do impeachment: o Planalto pretendia poupá-lo caso Cunha não desse seguimento aos processos contra Dilma Rousseff; a oposição não queria queimar as pontes com o então presidente da Câmara para não ver naufragar as chances de remover Dilma. No fim, o impeachment – um pedido juridicamente consistente, com avassaladoras justificativas legais – acabou usado por Cunha como retaliação política quando os petistas do Conselho de Ética anunciaram publicamente que votariam pela cassação do deputado.
Cunha mentiu à CPI da Petrobras quando disse não ter contas no exterior e, em sua defesa, apoiou-se em uma tecnicalidade inconsistente: o que o deputado tem na Suíça são trustes, e não contas, alegou. Marcos Rogério, acertadamente, não engoliu a justificativa, acrescentando em seu relatório que os tais trustes, cuja existência foi certificada por documentos enviados pelo Ministério Público suíço, foram usados para encobrir dinheiro de propina – de fato, as autoridades suíças afirmaram não apenas que os bens identificados e congelados eram de Cunha, mas também que, muito provavelmente, tinham origem ilícita. Não à toa Cunha se tornou o primeiro réu com foro privilegiado na Lava Jato, por decisão unânime do Supremo Tribunal Federal, em março deste ano. E, logo depois de sofrer sua derrota no Conselho de Ética, Cunha e sua mulher ainda tiveram bens bloqueados por decisão de Augusto Cesar Pansini Gonçalves, juiz da 6ª Vara Cível da Justiça Federal do Paraná.
A defesa de Cunha já anunciou que recorrerá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes que seu caso seja levado ao plenário da Câmara. Profundo conhecedor do regimento da casa, o deputado terá mais oportunidades de emperrar seu processo. Se Cunha não tem a decência de renunciar ao mandato, abreviando a novela, que seus pares na Câmara tomem a iniciativa de cassá-lo sem demora. Infelizmente, o placar apertado do Conselho de Ética mostra que não faltam apoiadores a Cunha e seus métodos, num sinal de que ainda há muito a fazer para que nosso parlamento chegue a níveis aceitáveis de moralidade.
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