A palavra “planejamento” comporta várias definições, e uma delas diz que “planejar significa prever para prover”. Ou seja, prever problemas e necessidades para prover medidas e ações capazes de resolver os problemas e atender às necessidades. De forma simplificada, as catástrofes podem ser listadas em três grupos: aquelas que causam destruição, embora tenham prazo curto de duração (caso de um terremoto); as que causam destruição e têm prazo médio de duração (caso de uma pandemia, uma seca, que dure um ou dois anos, por exemplo); e aquelas cujo processo de destruição se estende por muitos anos, a exemplo da Segunda Guerra Mundial, que começou em 1939 e foi até 1945. A pandemia do coronavírus já apresentou duas marcas: é uma catástrofe de alcance mundial, que está castigando praticamente ao mesmo tempo todos os países, e já dura mais de um ano sem que se saiba quando será totalmente superada.
A economia mundial sai muito debilitada em seus pilares mais importantes: o produto, o emprego, a renda pessoal, a pobreza e a desigualdade social. A queda do produto nacional e o aumento do desemprego bastam para ampliar a pobreza, aumentar o sofrimento das classes de menor renda e desorganizar o sistema produtivo. Somente isso deveria ser suficiente para induzir os líderes políticos e, em especial, o governo nas três esferas da federação a começarem agora a produzir um diagnóstico com os eventos e efeitos já conhecidos para, na sequência, elaborar um plano capaz de combater o caos quando a pandemia for embora.
O Brasil terá duros anos pela frente para sair da crise na qual foi lançado pela pandemia
Parece irreal falar em “recuperação” a essa altura, especialmente no caso do Brasil, que está vivendo o pior momento da pandemia em termos de novos casos, mortes e saturação do sistema hospitalar, com novas rodadas de medidas restritivas, em muitos locais até mais intensas que as adotadas um ano atrás. Mas um país devastado em sua base de produção e renda por obra de uma catástrofe sanitária não pode ficar inerte esperando que a recuperação virá sob as mesmas políticas e as mesmas regras de quando não havia nem pandemia nem recessão.
Além de ser necessário provocar o debate e chamar a atenção para esse problema, em face de circunstâncias até então desconhecidas, o mundo já viveu experiências similares que deixaram lições capazes de ajudar na compreensão do atual panorama econômico e social. O fim da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, produziu um movimento mundial no sentido de que o mundo deveria cooperar para reerguer os países devastadas pela tragédia, que não foi uma catástrofe natural, mas obra da estupidez humana. Em 1948, foi lançado o famoso Programa de Recuperação Europeia, que entrou para a história como Plano Marshall, numa referência ao secretário de Estado norte-americano George Marshall. Esse plano teve como objetivo o reerguimento da economia naqueles países que saíram quebrados da longa guerra.
Naquela época, entre os objetivos específicos, rapidamente foram removidas barreiras comerciais no comércio entre as nações e iniciou-se um ousado plano de modernização da indústria. Soa estranho que dois dos principais organismos internacionais estejam silenciosos quanto à gravidade da crise mundial: o Banco Mundial, cuja finalidade principal é financiar a expansão da infraestrutura, e o Fundo Monetário Internacional (FMI), que tem como foco o financiamento para países com déficit nas contas externas. Esses dois organismos têm quadros técnicos com capacidade para produzir diagnóstico de alta qualidade. Entretanto, o que mais se necessita de ambos neste momento, e após o fim da pandemia, é que exerçam liderança e digam que atitudes políticas são necessárias para a recuperação do mundo e quais dessas políticas serão assumidas por cada uma das duas instituições.
No caso do Brasil, o governo anunciou, no segundo semestre do ano passado, um plano intitulado Estratégia Federal de Desenvolvimento (EFD), que aponta os rumos do desenvolvimento nacional para o período 2020-2031 em 36 metas vinculadas a cinco eixos. O documento, entretanto, foi completamente ignorado pela população e praticamente caiu no esquecimento. Não importa se o governo atual é aprovado ou reprovado por quem quer que seja; o que está em jogo não é um governante, pois todos são passageiros. O que importa é o Brasil. E o país terá duros anos pela frente para sair da crise na qual foi lançado pela pandemia.