O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou dias atrás que o brasileiro provavelmente terá de se acostumar com o dólar em patamares semelhantes aos atuais, em que a moeda norte-americana tem batido recordes na cotação nominal (na cotação corrigida pela inflação, o auge da desvalorização do real ainda pertence ao primeiro ano do governo Lula). Guedes atribuiu a alta recente não a eventuais fraquezas da economia nacional, mas a um aspecto positivo: a queda da Selic, que está no menor patamar desde o início do regime de metas de inflação, em 1999.
Por mais que juros em queda sejam algo muito desejável, por facilitar a tomada de crédito por parte do setor produtivo para investimentos e por aliviar a parte da dívida do governo que é indexada pela Selic, existe o efeito colateral mencionado por Guedes: juros baixos deixam o Brasil menos “atrativo” para o capital internacional em comparação com os Estados Unidos e com outros países emergentes. A não ser que os juros norte-americanos também baixem em ritmo parecido ao brasileiro, a diferença entre aplicar no Brasil e nos EUA se reduz até o ponto em que o retorno de quem deixa o dinheiro por aqui já não compensa o “risco-Brasil” – que, apesar de estar em queda forte, ainda existe.
Se a intenção é de fortalecer o real sem intervencionismos, o governo precisa continuar investindo nas reformas que darão saúde fiscal ao país
Mas também há explicações menos benéficas para a recente disparada, e que vão além do mero fato de o mercado querer testar os limites do câmbio diante da despreocupação do ministro da Economia. Uma enorme expectativa de entrada de dólares acabou frustrada no megaleilão do pré-sal, em que grandes competidores estrangeiros ficaram de fora e, dos R$ 106 bilhões esperados pelo governo, vieram R$ 70 bilhões, que serão desembolsados principalmente pela própria Petrobras. Além disso, o Brasil continua privado do grau de investimento, conquistado em 2008 e perdido em 2015, no auge da grande recessão que o lulopetismo legou ao país.
O cenário externo também anda propício a uma “fuga para a segurança” representada pelo dólar. A guerra comercial entre China e Estados Unidos ainda está longe de terminar, oscilando entre momentos de apaziguamento e de hostilidade aberta – o presidente americano, Donald Trump, acabou de irritar os chineses ao assinar uma lei que, na prática, representa apoio aos protestos pró-democracia em Hong Kong. O novo adiamento conseguido pelo premiê britânico, Boris Johnson, continua a indefinição sobre as condições em que ocorrerá o Brexit. E, por mais que os grandes ataques especulativos do fim dos anos 90 tenham ficado para trás, o Brasil continua a sofrer efeitos do que ocorre em países vizinhos e emergentes. É o caso da guinada da Argentina para a esquerda: por mais diferenças que existam entre as políticas econômicas de Alberto Fernández e Jair Bolsonaro, a incerteza também respinga no Brasil, parceiro comercial e de bloco econômico.
O dólar alto ajuda exportadores, mas também encarece as importações e diversos produtos de grande impacto inflacionário, como o petróleo. Se a intenção é de fortalecer o real sem intervencionismos, o governo precisa continuar investindo nas reformas que darão saúde fiscal ao país – o que inclui a reforma administrativa, infelizmente adiada para 2020 –, reduzindo o tamanho do Estado e atraindo o capital estrangeiro por meio de concessões e privatizações. À medida que o Brasil for se tornando um país economicamente sólido e confiável, será capaz de trazer divisas que mantenham o câmbio nos patamares adequados.
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