Quando, no fim de 2016, a eleição de Donald Trump surpreendeu nove entre dez analistas políticos e jornalistas norte-americanos, eles embarcaram imediatamente em uma tentativa de compreender o que tinha acontecido, e como tinham sido incapazes de prever aquele desfecho. Em alguns casos, as conclusões soavam quase como uma acusação ao eleitor que havia optado por um candidato famoso por declarações preconceituosas; foram pouquíssimos os que perceberam a importância que os temas morais haviam assumido na corrida presidencial americana e reconheceram a legitimidade dessa preocupação. Um fenômeno que, agora, se repete no Brasil, com a ascensão de Jair Bolsonaro (PSL) ao segundo turno da eleição presidencial que terá seu desfecho no próximo dia 28, além da eleição de diversos parlamentares que assumem plataformas ligadas a tais temas.
Embora a questão do aborto não seja a única, e talvez não tenha em 2018 a relevância que teve em 2010, quando Dilma Rousseff não conseguiu esconder a defesa da legalização que havia feito no passado, e por isso perdeu a chance de vitória no primeiro turno, ela tem mobilizado a sociedade brasileira de forma intensa desde que o PSol protocolou a ADPF 442, que está no Supremo Tribunal Federal e pretende a legalização até a 12.ª semana de gestação. Por mais que tenha sido outra legenda a autora da ação, o PT tem tido uma postura favorável ao aborto desde muitos anos atrás, oficializando essa posição em congressos e encontros nacionais. Quando no governo, a legalização do aborto foi incluída entre as metas a atingir pelo Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH3), ainda no governo Lula.
É motivo de celebração, não de alarmismo, quando um povo assume bons valores com tanta ênfase
Mais recentemente, também a ideologia de gênero entrou no radar das preocupações dos brasileiros, especialmente os que têm filhos em idade escolar. As teorias que negam a biologia para defender que masculino, feminino e o que mais existir em termos de gênero não passam de construções sociais foram repelidas pelo Poder Legislativo no Congresso, em várias Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores, durante as votações dos planos nacional, estaduais e municipais de educação. Mesmo assim, setores aparelhados do Ministério da Educação continuaram insistindo no tema em suas orientações e treinamentos de educadores, além de tentar incluir a ideologia de gênero na Base Nacional Comum Curricular. Estavam prestes a ter sucesso, quando o MEC resolveu fazer as alterações necessárias. O plano de governo de Fernando Haddad prevê “políticas de promoção da orientação sexual e identidade de gênero” e, embora não cite sua implantação nas escolas, afirma que a BNCC será alterada para “retirar as imposições obscurantistas”.
E outro tema importantíssimo para o brasileiro, o caos na segurança pública, também está ligado a uma questão moral, que é o uso de drogas. Elas destroem famílias – quem já sofreu ou sofre com filhos, pais, irmãos, parentes dominados pela dependência bem o sabe – e alimentam uma indústria movida pela violência urbana, que destrói muitas outras famílias quando um ente querido lhes é tirado por razões as mais banais, com chances ínfimas de o criminoso ser capturado e punido. No entanto, o petismo deseja aliviar justamente para o traficante que oferece as drogas aos nossos filhos, simplesmente por se tratar de “pessoas não violentas, não organizadas e desarmadas”, enquanto destaca “resultados positivos com a descriminalização e a regulação do comércio”.
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Então, quando se fala do “antipetismo” que move o eleitor neste 2018, é impossível diminuir a importância dessas questões para o brasileiro. O PT pode não ser o único partido a defender o aborto, a ideologia de gênero ou a legalização do uso de drogas, mas é o que tem esticado a corda ao máximo nesses e em outros temas. Já havia muito tempo que o brasileiro esperava um político ou um partido que assumisse com firmeza a defesa da família e fizesse oposição ao petismo também nessas plataformas. Quando finalmente surgiu alguém, o eleitor o adotou – apesar de todas as ressalvas que podem e devem ser feitas à figura de Bolsonaro.
A intelligentsia brasileira, presa em sua bolha e que muitas vezes compartilha do ideário moral esquerdista, tem enorme dificuldade em perceber essa realidade – e, quando a percebe, descreve-a como algo negativo, “alertando” para o “crescimento do conservadorismo”. Ora, o que há de alarmante ao perceber que o brasileiro quer defender a família e valorizar a vida em todos os seus momentos, desde a concepção; que repudia imposições ideológicas que falseiam a verdade sobre a realidade básica das diferenças e das complementariedades entre homem e mulher; que deseja ver seus filhos saudáveis, livres de vícios que destroem a vida de quem neles mergulha? Pelo contrário, é motivo de celebração quando um povo assume esses valores com tanta ênfase.
Assim, mais que descrever o ânimo do eleitor por um viés puramente negativo, atribuindo os resultados das urnas a uma genérica rejeição ao petismo, temos de compreender que o brasileiro está sendo movido também – e, talvez, principalmente – por um sentimento bastante positivo, o da defesa de valores caros à civilização, da dignidade da pessoa humana, dignidade essa que é aviltada quando se nega a alguém o direito à vida ou a verdade sobre a própria identidade, bem como quando se lhe franqueia um comportamento destrutivo, como se não fosse nada de mais. Que cada vez mais brasileiros percebam a importância desses valores e guiem não apenas seu voto, mas toda a sua vida por eles.