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Nesta semana a reforma política voltou a ser discutida no Congresso Nacional, com a formação de uma comissão de senadores para estudar o assunto. Tal discussão começou com entraves, que mostram a dificuldade de se elaborar uma proposta consistente de reestruturação do sistema político brasileiro. Primeiro porque os senadores, assim como deputados federais que também participarão da discussão quando a proposta for encaminhada à Câmara, têm interesses diretos no modelo de reforma que irá ser aprovada. Pois podem redefinir o sistema político a fim de garantir a sua própria perpetuação – e a de seus familiares – no poder.

Um indício de que isso pode ocorrer foi o fato que, nesses momentos iniciais, nenhum dos senadores envolvidos cogitou tratar de pontos que realmente possam fazer a diferença. Embora o senador Itamar Franco (PPS-MG) tenha comentado que a reforma não poderia se restringir a temas eleitorais, afirmando ser necessário rediscutir o pacto federativo, não apresentou propostas bem definidas. Enfim, nenhum dos parlamentares sugeriu, por exemplo, a criação de regras que permitam a democratização dos partidos. Atualmente, a vida partidária é dominada por caciques regionais que atuam, em boa parte dos casos, como donos das legendas, impedindo o surgimento de novas lideranças.

O segundo ponto que chama a atenção é o desejo de que a comissão formule uma proposta de reforma política em 60 dias. A análise que os congressistas fazem é que se não conseguirem aprovar a reforma neste ano, ela não irá ocorrer em outro momento do governo de Dilma Rousseff, como não andou no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A classe política tem consciência da dificuldade de fazer tal reforma no próximo ano – de eleições municipais – assim como da diversidade de ideias e concepções entre os parlamentares a respeito do assunto.

Embora se tenham certa razão em tentar agilizar a tramitação dessa reforma para torná-la realizável, a reestruturação do sistema político tem tamanha seriedade que não poderá ser discutida e aprovada e no afogadilho. Não é possível que ela seja feita a qualquer custo. Caso uma dinâmica de aprovação relâmpago venha a ser adotada, quem perderá no fim do processo certamente será a sociedade. Pois, não terá espaço nem possibilidade para apreciar de forma aprofundada as alterações propostas pelos parlamentares para a organização política do país. Há um grande risco de que uma aprovação rápida seja benéfica aos principais interessados, os políticos.

Afora mecanismos que permitam uma democracia partidária real que podem trazer mudanças substanciais e benéficas ao sistema político brasileiro, há temas eleitorais que merecem a devida atenção dos parlamentares, como a mudança do atual sistema de votação proporcional para deputados. Hoje, a partir do número total de votos que um partido ou uma coligação têm, calcula-se o número de vagas que terão na Câmara dos Deputados, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras Municipais.

Se o modelo atual não é o ideal, pior ainda seria transformá-lo em meramente distrital. Pois, nesse caso, o voto se tornaria "paroquial" e os interesses a serem representados seriam simplesmente locais.

Há também temas que vêm sendo sugeridos toda a vez que se fala de reforma política e que podem se tornar um retrocesso, se aprovados. É o caso do financiamento público de campanha. Vale lembrar que atualmente o sistema de financiamento é misto, com partidos recebendo recursos do tesouro nacional e podendo usar tempo de propaganda eleitoral na televisão, que também tem seu custo para o contribuinte. É questionável se o financiamento público de campanha iria coibir desvios, mas já não é tão difícil de imaginar que os recursos públicos possam vir a ser usados mais para projetos pessoais dos dirigentes que dominam as legendas, que em prol de uma ideologia partidária.

O debate sobre reforma política vai além da mera retórica da necessidade de mudanças. Que há distorções sérias em nosso sistema, isso está bastante evidente. Caso a comissão elabore uma proposta de reforma, o projeto terá de atingir pontos que são essenciais para corrigir rumos de nossa política, tornando os partidos mais democráticos internamente e resgatando a ética como motor da vida pública. Sem dispositivos que garantam isso, teremos alterações cosméticas, ou pior que isso, mudanças que beneficiem apenas determinados grupos políticos que pretendam se manter no poder indefinidamente.

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