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O mercado de trabalho brasileiro caminha para uma perigosa estagnação, a julgar pelos últimos dados divulgados tanto pelo Ministério do Trabalho quanto pelo IBGE. Mesmo o Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados (Caged), que vem registrando uma longa sequência de resultados positivos, com exceção apenas de dezembro de 2021, mostra uma desaceleração: em março, foram criadas 136,2 mil vagas de emprego com carteira assinada, contra os 329,4 mil de fevereiro. O primeiro trimestre deste ano, embora termine com um saldo positivo de 615 mil novos postos, fica abaixo do mesmo período de 2021, quando o país ainda vivia uma fase crítica da pandemia de Covid-19 – no primeiro trimestre do ano passado, o Novo Caged registrou 805 mil contratações a mais que demissões.
Da mesma forma, a Pnad Contínua do IBGE mostrou que a taxa de desemprego se manteve estável, em 11,1% no primeiro trimestre de 2022. Desde o último trimestre do ano passado a taxa vem oscilando entre 11,1% e 11,2%, depois de uma série de quedas significativas, de meio ponto porcentual a cada mês, após o pico de 14,9% no primeiro trimestre de 2021. O número mais recente, no entanto, superou as estimativas de mercado, que previa algo entre 11,3% e 11,7%. O número de desempregados teve uma leve queda, e ficou abaixo de 12 milhões pela primeira vez em mais de um ano.
O Brasil ainda tem taxas de desemprego muito altas para que haja uma estabilização do mercado de trabalho
Apesar da estabilidade, os dados do IBGE trazem alguns recortes ligeiramente positivos. O rendimento médio continua em leve tendência de alta, depois de vir caindo há mais de um ano – mesmo assim, os R$ 2.548 registrados agora ainda estão bem longe dos R$ 2.931 de julho de 2020. Também houve pequena redução na taxa de informalidade, de 0,6 ponto porcentual na comparação com o último trimestre de 2021, mas ela segue alta, atingindo 40,1% dos brasileiros ocupados. O número de desalentados, aqueles que nem mesmo chegaram a procurar emprego nos últimos três meses, também teve redução: agora, são 4,6 milhões de brasileiros nesta situação, contra 4,7 milhões no trimestre móvel encerrado em fevereiro.
Comentando os números do Caged, membros do governo afirmaram que a desaceleração no ritmo de contratações está ligada ao fim do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda (BEm) – que permitia acordos de redução proporcional de jornada e salário, ou suspensão temporária do contrato de trabalho, em troca da manutenção do emprego e da estabilidade por alguns meses – e seria um fenômeno natural após a retomada mais forte registrada em 2021. O grande problema é que o Brasil ainda tem taxas de desemprego muito altas para que haja essa estabilização. Levantamento da agência de classificação de risco Austin Ratings, baseado em projeções do FMI, mostra que o Brasil deve encerrar o ano com desemprego de 13,7%, o nono pior desempenho em um grupo de 102 países. Mas, mesmo se o país mantiver os 11,1% atuais, ainda terá taxas muito piores que as previstas para a média global (7,7%) e a média dos emergentes (8,7%) e do G20 (8%).
Esses números são ainda mais alarmantes considerando que o Brasil deve crescer menos que o resto do mundo neste ano. O FMI revisou para cima suas expectativas para o país, mas o 0,8% estimado agora ainda está abaixo da projeção de crescimento global (3,6%), dos emergentes (3,8%), das economias desenvolvidas (3,3%) e da América Latina (2,5%). Com a persistência da inflação, que parece não dar trégua nem mesmo com a adoção da bandeira mais barata para a energia elétrica, o ciclo de aperto monetário promovido pelo Banco Central deve continuar, o que dificulta ainda mais o crédito, o consumo e os investimentos que gerariam emprego e renda.
Sem que a economia demonstre vitalidade suficiente para seguir absorvendo os brasileiros hoje sem emprego, o mercado de trabalho dependeria do empurrão que poderia vir por meio de reformas e mudanças legais, mas nem isso deve ocorrer também. À medida que as eleições se aproximam, qualquer discussão sobre reformas macroeconômicas tende a parar. A tão necessária desoneração da folha de pagamento empacou porque, a julgar pelo que vem da equipe econômica e até de empresários, a única forma de compensá-la seria com um imposto semelhante à antiga CPMF, solução rejeitada pelo Congresso e que condena o debate à paralisia total devido à incapacidade de encontrar outras alternativas. Juros em alta, crescimento baixo e políticos com outras prioridades são a receita para perpetuar uma das piores mazelas socioeconômicas que um país pode enfrentar.