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Editorial

A festa de Lula

Hoje tem festa junina na Granja do Torto. O presidente Lula e a primeira-dama Marisa Letícia, devidamente paramentados para a ocasião, receberão ministros, assessores e amigos – dos quais se exigiu também vestimenta apropriada – para a confraternização que já se tornou usual. Este ano, porém, o presidente acredita ter muito mais a comemorar do que simplesmente cumprir uma tradição tão brasileira.

De fato, há mesmo um grande motivo a justificar a alegria presidencial. Trata-se do resultado da mais recente pesquisa de opinião do Instituto Sensus, divulgada esta semana. A sondagem apontou que 64% dos brasileiros apóiam o desempenho pessoal de Lula – índice pouco mais alto do que o da rodada anterior da mesma pesquisa e bem mais alto do que a pontuação obtida pelo governo (47,5% agora contra 49,7 em abril). Ou seja, a percepção popular é de que Lula é melhor do que o governo que ele próprio preside.

Não deixa de ser um fenômeno intrigante o fato de sua avaliação permanecer em níveis tão positivos, a despeito de todas as crises e atribulações que afetam (ou são de sua responsabilidade direta) o governo. Exemplos? Vejam-se os casos mais recentes, exatamente aqueles que mais conturbaram o cenário no período entre a penúltima e a última pesquisa: o recrudescimento do apagão aéreo, o envolvimento de um irmão e de um compadre em nebulosos negócios com jogos clandestinos e o afastamento de um ministro por suposto favorecimento à notória construtora de Zuleido Veras em troca de propina. Paralelamente, eclodiram os rumorosos escândalos protagonizados por aliados políticos, como os senadores Renan Calheiros, presidente do Congresso Nacional, e Joaquim Roriz.

Nada disso "grudou" na imagem presidencial. Nada foi suficiente para que a opinião pública identificasse qualquer laivo de responsabilidade ou de participação pessoal de Lula em tais episódios. Ele parece estar acima do bem e do mal. Está ainda a merecer um bem aprofundado estudo de caso, em nível acadêmico e multidisciplinar. Entretanto, é possível reunir alguns elementos que, embora superficial e empiricamente, expliquem o fenômeno.

Em primeiro lugar, deve-se levar em conta a predominante presença de Lula na mídia. Por si só, porém, isto nada significa se não se considerar os inegáveis dotes do presidente para comunicar-se com facilidade e quase sempre de modo a obter simpatias. Neste sentido, foi emblemática e produziu grande efeito a sua postura diante do caso do irmão, Vavá, recusando-se a protegê-lo das embaraçosas investigações da Polícia Federal. Da mesma forma, livrou-se logo do ministro das Minas e Energia, Silas Rondeau. E, com relação ao caos aéreo, reconheceu na hora certa que se tratava de um problema disciplinar a ser resolvido pelas autoridades militares. Quanto a Renan e Roriz, limita-se a mantê-los a certa distância.

Veja-se que não resolveu nenhum problema – mas conseguiu se safar convenientemente de todos. E aí entra outro fator que explica a intocabilidade de sua imagem: sem dúvida, Lula é dotado de uma aguda inteligência, de enorme senso de oportunidade e fina percepção do que é do agrado das massas ouvir. Em suma, o presidente sabe intuitivamente fazer o que tanto recomendam os mais renomados e modernos consultores de recursos humanos – o marketing pessoal.

A economia vai razoavelmente bem. Reconheça-se, todavia, que o presidente não tem todos os méritos. Embora bafejado pelos bons ventos da economia mundial e pela estabilidade monetária que herdou do antecessor, mantém o país crescendo a passos de cágado, em velocidade e consistência muito inferiores às dos demais países emergentes. Nem mesmo o festejado Plano de Aceleração Econômica (PAC) é capaz de produzir frêmitos de entusiasmo popular. A corrupção deslancha, a violência cresce, os investimentos rareiam. O governo não vai, portanto, tão bem quanto poderia.

Mas isso não é com Lula. Misteriosamente, isso é só com o governo, do qual, às vezes, o presidente parece sequer fazer parte. Daí a distância de quase 20 pontos entre eles, apontada pela pesquisa Sensus. Um mistério a ser desvendado.

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