A impressionante velocidade do impeachment e o pouquíssimo tempo concedido à defesa de Lugo tornam legítimo questionar se o presidente não estaria sendo vítima de um golpe de Estado tramado pela oposição, apesar de o processo estar previsto na Constituição
A crise política que culminou, ontem, com a decisão do Senado paraguaio em favor do impeachment do presidente Fernando Lugo revela a fragilidade da democracia no país vizinho. Apesar de o governo civil ter retornado ao país há quase 20 anos, o Paraguai não deixou de passar por episódios de tentativas de golpe e assassinatos políticos e, novamente, a instabilidade ronda o país, trazendo consequências sérias para todo o continente. Lugo resistiu às pressões para renunciar, recorreu à Suprema Corte paraguaia para manter seu mandato, mas em discurso na noite de ontem acatou a decisão do Senado.
A impressionante velocidade do processo de impeachment motivado por suposta incompetência presidencial, especialmente no caso do massacre de Curuguaty, em que morreram 17 pessoas em um confronto entre policiais e sem-terra e o pouquíssimo tempo (menos de um dia) concedido à defesa de Lugo tornam legítimo questionar se o presidente não estaria sendo vítima de um golpe de Estado tramado pela oposição (que domina as duas casas do Parlamento paraguaio), apesar de o processo estar previsto na Constituição. Ainda está na memória dos brasileiros o impeachment de Fernando Collor, em 1992; a duração do processo permitiu ampla discussão política, com o direito de defesa concedido ao então presidente e a participação expressiva da imprensa e da sociedade civil.
Se a motivação dos parlamentares for realmente a pura e simples remoção de Lugo, cuja eleição rompeu com 60 anos de domínio do Partido Colorado, o tiro corre o risco de sair pela culatra, caso os sem-terra paraguaios grupo que contou com a complacência e, às vezes, incentivo de Lugo durante seu mandato, inclusive ameaçando fazendeiros brasiguaios cumpram a promessa de não permitir que o presidente deixe o cargo. Sabiamente, Lugo pediu aos compatriotas que se manifestem apenas de forma pacífica, mas ainda não se sabe como os movimentos sociais reagirão. Eventais episódios de instabilidade e violência poderiam abrir espaço para a ascensão de um governo autoritário, encabeçado pela esquerda ou mesmo por militares que, até o momento, não têm se manifestado, mas já promoveram tentativas de golpe em 1996 e 2000.
Caso a crise se intensifique, será importante a atuação das demais nações sul-americanas. É verdade que aliados bolivarianos de Lugo apelam ao respeito à democracia no Paraguai apenas como instrumento retórico, já que, em seus próprios países, o venezuelano Hugo Chávez, o boliviano Evo Morales e o equatoriano Rafael Correa demonstram pouquíssima ou nenhuma consideração pelas instituições democráticas. Os governos de Brasil e Argentina haviam prometido não reconhecer um novo governo. Assim, a tarefa de assegurar um bom desfecho à instabilidade institucional parece estar apenas nas mãos dos próprios paraguaios. O primeiro passo foi dado por Lugo, ao pedir que não se recorra à violência um conselho essencial para evitar que o Paraguai fique à deriva.