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A polêmica questão da legalização do aborto volta a ser discutida no Brasil, desta vez por conta de uma posição defendida pelo recém-empossado ministro da Saúde, José Gomes Temporão. A proposta de Sua Excelência seria a disponibilização da rede pública de saúde nacional para realizar procedimentos de interrupção de gravidez indesejada. Na justificativa para a adoção das práticas abortivas estariam as incontáveis mortes de mães brasileiras que se submetem clandestinamente ao método, o que tornaria o aborto um problema de saúde pública hoje no país, autorizando, assim, incluí-lo como uma prática médica legal e assistida com recursos governamentais.

Este enfoque, contudo, embora relevante, deve ser melhor contextualizado e, de qualquer forma, não é o que deve prevalecer no exame da questão. É a dimensão ética do aborto – e, portanto, a dimensão verdadeiramente humana e social – que assume caráter essencial. Quaisquer outras abordagens falecem diante do aspecto central – ou seja, a vida humana, valor que não suporta os relativismos frutos do crescente individualismo próprio do mundo atual. Ora, o aborto provocado é uma indiscutível agressão a este valor.

Contrariamente à precipitação com que alguns querem conduzir as discussões, é preciso lembrar dos preceitos dispostos na legislação brasileira, que, de forma clara e taxativa, na melhor tradição democrática, garantem a vida humana como um bem e um direito invioláveis. É o que estabelece, em primeiro plano, sem margem para dúvidas, o art. 5.º da Constituição Federal, que insere o direito à vida no rol dos chamados direitos e garantias fundamentais. Complementando esse texto, o Pacto de S. José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil em 1992 e incorporado, por força constitucional (art. 5.º, §2.º), ao nosso ordenamento jurídico, estabeleceu que "Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção" (art. 4.º).

Não foi outro, ainda, para dar apenas mais um marco legal, o pensamento que norteou a elaboração do Código Civil de 2002, o qual, em seu artigo 2.º, prevê que "a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro".

Além de tudo isso, ciente da importância da Carta Constitucional que se elaborava naquele já distante 1988, nossos representantes legais fizeram constar de seu texto, de forma clara e expressa, que não seria objeto de deliberação nenhuma proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais (art. 60, § 4.º, inciso IV).

Diante disso, pode-se concluir que, no ordenamento jurídico vigente, o direito à vida, desde a concepção, é inviolável; e, ainda, que por integrar os chamados direitos e garantias fundamentais, apresenta-se ele como obstáculo intransponível a qualquer tentativa de legalização do aborto (inclusive por emenda constitucional). Atualmente, portanto, qualquer projeto de lei que vise à legalização de tal prática esbarra em cláusula pétrea constitucionalmente prevista, qual seja, a da inviolabilidade.

Tudo isso é muito claro, mas ainda que não fossem tantas e tão explícitas as normas vigentes, a dimensão ética e humana do valor vida, corretamente entendido, jamais poderia deixar de prevalecer.

Múltiplos são os aspectos sob os quais a questão do aborto pode ainda ser vista, todos eles levando à conclusão da inoportunidade e equívoco de uma proposta de legalização de práticas abortivas no país, com ou sem apoio e financiamento estatais. Alguns desses pontos dizem respeito aos conceitos sobre o início da concepção da vida humana e as implicações éticas decorrentes da sua interrupção. A Gazeta do Povo pretende abordar o assunto neste espaço editorial também nas edições de amanhã e terça-feira, tomando firme posição contrária à nova e quaisquer outras tentativas de legalização do aborto.

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