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Editorial

A independência, a democracia e as liberdades

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(Foto: Gerson Klaina/Tribuna)

No próximo dia 7 de setembro, o Brasil comemora o bicentenário de sua independência, oportunidade adequada para refletir sobre o que o país fez nestes 200 anos desde sua libertação em relação ao império português. Logo no mês seguinte, a população irá às urnas para eleger governadores, deputados estaduais, presidente da República, deputados federais e um terço do Senado Federal. Um bom começo para a análise sobre os governantes que a sociedade quer para a nação é supor que os eleitores buscarão votar em candidatos tomando por base o histórico, os princípios e as políticas que os candidatos defendem. Assim, um político intelectualmente honesto é aquele que diz claramente à nação qual sua ideologia, suas crenças e propostas, e que modelo de sociedade, regime político e modelo econômico constituem seu plano de trabalho.

É da ideologia de um candidato que derivam suas propostas para o regime político, a Constituição, as instituições públicas, as funções do Estado e os limites dos poderes do governo sobre a sociedade. A condição ideal é que eleitores esclarecidos e informados votem em candidatos com os quais se identifiquem em termos de regime político (democracia ou ditadura), sistema econômico (capitalismo liberal ou capitalismo de Estado) e pauta de costumes. De forma simplificada, um candidato pode se colocar ao lado da democracia política, da liberdade econômica e dos direitos individuais condizentes com uma sociedade livre e aberta; ou pode se colocar ao lado da ditadura política, da economia estatizada e da forte intervenção estatal, porém mantido o direito de propriedade; ou o candidato pode, ainda, defender um regime socialista clássico, com ditadura política, economia estatizada, sem direito de propriedade privada dos meios de produção e direitos individuais limitados pelo governo, um modelo que pode ser encontrado em Cuba, na velha União Soviética e, com variações, na própria China.

De forma explícita ou velada, os partidos de esquerda no Brasil têm preferência por modelos com viés socialista e não escondem sua simpatia pelas ditaduras cubana e chinesa

O modelo chinês, aliás, é o que Lula já defendeu publicamente, como quando disse a um jornal daquele país, em julho de 2021, que a China tinha sucesso na luta contra a Covid-19 por ter “um partido político forte e um governo forte”. Da mesma forma, a ex-presidente Dilma Rousseff afirmou, em novembro do ano passado, que “a China representa uma luz nessa situação de absoluta decadência e escuridão que é atravessada pelas sociedades ocidentais”. De forma explícita ou velada, os partidos de esquerda no Brasil têm preferência por modelos com viés socialista e não escondem sua simpatia pelas ditaduras cubana e chinesa. Os líderes esquerdistas brasileiros há tempo elogiam publicamente os regimes da Venezuela, antidemocrático e contra as liberdades, e o regime da Argentina, cujo governo esquerdista ressuscitou o que há de mais atrasado e equivocado em matéria de modelo econômico, limitação da propriedade, proibição de exportação, redução da liberdade de mercado e, por fim, o velho e trágico congelamento de preços. O mais curioso é que a retórica discursiva dos regimes ditatoriais finge exaltar a democracia a ponto de alguns países comunistas terem chegado ao extremo de colocar a palavra “democrática” em seu nome oficial, como foi o caso da Alemanha Oriental e ainda é o caso da Coreia do Norte.

Infelizmente, a política diária e as campanhas eleitorais têm sido eivadas de contradições que confundem e não permitem saber claramente o que o candidato pensa e quais medidas ele executará caso seja eleito. Um candidato que defende reestatizar empresas privatizadas, tributar pesadamente heranças, manter os atuais monopólios estatais, reestatizar velhos monopólios privatizados, regular a imprensa e a liberdade de expressão, aumentar o poder estatal e se inspirar no modelo chinês (uma ditadura política de partido único, com economia sob total controle do governo e limitação das liberdades individuais), mas diz tudo isso usando palavras como “democracia”, “liberdade”, “emprego”, “prosperidade” e “respeito aos direitos individuais”, ou age de má-fé ou quer deliberadamente confundir a população. É a velha linguagem do “duplipensar”, introduzida pelo livro 1984, de George Orwell, escrito em 1948 – ou seja, enquanto na União Soviética vigorava a ditadura stalinista. A propaganda do Estado autoritário onde se desenrolava a trama se destinava a passar a mensagem de que “ódio é amor”, “morte é vida”, “tortura é educação” e “controle é liberdade”.

O duplipensar é a técnica de incorporar duas ideias ou crenças contraditórias, incompatíveis uma com a outra, e levar a pessoa a acreditar em ambas. Os políticos e pensadores dos partidos que assim agem sabem que estão enganando e manipulando a realidade e o eleitorado com o objetivo de conquistar o poder para, após eleitos, fazerem o que quiserem e impor suas regras e controles sobre a população e as instituições. Os ditadores mais sanguinários da humanidade, sobretudo nos clássicos regimes comunistas que legaram mais de 100 milhões de mortos durante seus governos, refinaram suas doutrinas e seus discursos para cometer as maiores atrocidades sob palavras e argumentos nobres – bem o sabem as vítimas da “ternura” do carniceiro Ernesto “Che” Guevara. De forma mais amena, mas não menos perigosa, têm sido, em países tidos como livres, as repetidas ações antidemocráticas, contra as liberdades e em flagrante desrespeito ao Estado de Direito praticadas por governos e autoridades nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A campanha eleitoral se iniciou nesta terça-feira e, se o futuro do Brasil for julgado pelos discursos e declarações de todos os candidatos, no país vigorarão a democracia política, a economia de mercado, as liberdades individuais e o Estado de Direito. O problema começa quando políticos, autoridades e candidatos adotam a linguagem do duplipensar e usam expressões ditas “do bem” apenas com o intuito de conquistar votos e apoios para, depois, enganar e trair seu próprio discurso. Nestes dois séculos desde o Grito da Independência, cabe ao povo brasileiro firmar o compromisso de não permitir que a nação se jubile por ter se libertado do jugo de Portugal para cair sob o jugo de governos autoritários, antidemocráticos, opostos às liberdades econômicas e individuais, e moralmente corruptos.

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