O IPCA-15 de abril assustou quando, em meados do mês passado, chegou a 1,73%, ainda que as projeções do mercado financeiro fossem de uma variação ligeiramente maior. Com a inflação fechada de abril, divulgada nesta quarta-feira pelo IBGE, ocorreu o contrário: ainda que ela tenha ficado em 1,06%, longe de sua “prévia”, ela foi superior às estimativas das instituições de mercado, que previam, na mediana das projeções colhidas pelo ValorData, exato 1%. Com isso, o acumulado de 2022 já ultrapassou a meta de 3,5%, estando em 4,29%; e o acumulado dos últimos 12 meses subiu para 12,03%, o maior para um período semelhante desde outubro de 2003. Terá o choque inflacionário que o Copom avaliou como “temporário” por tantos meses se tornado permanente?
O fenômeno inflacionário atual, como já se sabe, é mundial – os Estados Unidos, por exemplo, estão enfrentando as maiores altas de preços dos últimos 40 anos, com o acumulado de 12 meses chegando a 8,3% em abril. Evidentemente, há nações cujas políticas são capazes de mitigar o efeito global, e outras cujas escolhas em termos de política econômica apenas aumentam o desastre, como a Argentina, cuja inflação deve ultrapassar os 60% neste ano, de acordo com o Banco Central argentino. Além disso, à série de eventos de alcance mundial acrescentam-se outros, de caráter local, mas que também ajudam a elevar ou reduzir a inflação.
O Brasil usa as poucas armas que tem para tentar segurar a inflação. O Copom segue elevando os juros, e o Executivo tem realizado reduções pontuais de impostos tanto de produtos nacionais quanto importados
Hoje, são três os principais fatores que colocam o Brasil no banco do carona em termos de inflação. As novas ondas de Covid-19 na China estão, mais uma vez, desorganizando as cadeias globais de produção graças aos severos lockdowns impostos pelo regime comunista chinês, além de afetar a procura por commodities. O ataque russo à Ucrânia, em um conflito que já dura quase três meses, afetou duramente o fornecimento de produtos dos quais ambos os países são grandes exportadores, como é o caso do trigo – apenas Rússia e Ucrânia respondem por quase um terço de todas as exportações do produto e seus derivados. E, por fim, o continuado choque nos preços do petróleo, em processo de alta desde que a maior parte do mundo deixou para trás o pior da pandemia, encarece combustíveis em quase todo o planeta.
Entre as circunstâncias internas que agravaram a inflação brasileira, ainda, estão quebras de safra decorrentes de eventos climáticos, como ocorreu com a soja na Região Sul; hortaliças, verduras e frutas sofreram com problemas semelhantes. Além disso, até meados de abril o Brasil conviveu com a mais alta das bandeiras tarifárias de energia elétrica, criada especialmente para arcar com as despesas adicionais trazidas pela crise hídrica, hoje superada. A energia elétrica, aliás, foi responsável por uma das poucas boas notícias do IPCA de abril, pois o grupo Habitação registrou deflação de 1,14%, especialmente graças ao retorno da bandeira tarifária verde na segunda quinzena do mês. Parte dessa queda, no entanto, deve ser revertida graças a reajustes autorizados pela Aneel neste ano – a tentativa do Congresso de impedir os aumentos por meio de decreto legislativo é um populismo que traz ganhos de curtíssimo prazo a um custo bem mais alto no médio e longo prazos.
Neste cenário, o Brasil usa as poucas armas que tem para tentar segurar a inflação. O Copom segue elevando a taxa básica de juros, infelizmente comprometendo a recuperação da economia neste processo, ainda que necessário; mesmo assim, aumentos semelhantes de juros nos Estados Unidos acabam levando a uma valorização do dólar, elevando ainda mais a pressão inflacionária brasileira. Já o Executivo tem realizado reduções pontuais de impostos tanto de produtos nacionais quanto importados – uma estratégia que, para funcionar, depende de o Supremo Tribunal Federal abandonar intervenções abusivas como a ocorrida no caso do IPI de produtos que concorrem com itens fabricados ou montados na Zona Franca de Manaus. Já um ajuste fiscal sólido, que elevaria a confiança internacional na saúde fiscal do Brasil e poderia atrair dólares, reduzindo a cotação da moeda norte-americana, infelizmente está fora do radar neste momento.