| Foto: José Cruz/Agência Brasil

Em 31 de dezembro de 2016, o brasileiro tinha uma esperança para o ano que se iniciava: que o Supremo Tribunal Federal finalmente julgasse alguma das denúncias oferecidas à corte suprema contra políticos com foro privilegiado envolvidos no escândalo de corrupção desvendado pela Operação Lava Jato. Quando os fogos estourarem, daqui a alguns dias, só restará ao brasileiro repetir o mesmo desejo, frustrado ao longo de 2017. Enquanto o juiz federal Sergio Moro mantém sua habitual velocidade no julgamento dos demais participantes do esquema, e várias dessas sentenças já foram analisadas também pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, a quem cabe julgar os recursos, o Supremo ainda não julgou nenhum dos réus com foro privilegiado.

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Pode-se argumentar que a Lava Jato no STF passou por uma circunstância extraordinária no início do ano, com a morte do relator dos processos, ministro Teori Zavascki; o sorteio colocou a relatoria nas mãos de Edson Fachin, que precisou de tempo para se inteirar do teor das investigações. A comparação entre o STF e Moro ainda pode parecer injusta, já que o juiz federal decide monocraticamente e só tem a Lava Jato entre suas atribuições, enquanto o Supremo é um colegiado que decide sobre absolutamente tudo – neste ano que se encerra, coube ao STF decidir até o campeão brasileiro de futebol de 1987.

Há uma dúzia de denúncias já oferecidas pela PGR, esperando que o STF decida se os denunciados devem virar réus

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Além disso, o ritmo da Procuradoria-Geral da República (PGR), responsável por enviar ao Supremo as denúncias contra políticos com mandato, também é bem mais lento que o da força-tarefa baseada em Curitiba, até mesmo devido a regras que engessam a investigação, exigindo do STF autorização para procedimentos que, em outras instâncias, não dependem desse tipo de aval. O gargalo maior, olhando atentamente, estaria não tanto no Supremo, mas na PGR, que demora a oferecer as denúncias contra investigados com foro privilegiado.

Mas, mesmo levando em consideração todos esses fatores, ainda não há como justificar para a opinião pública o fato de nenhum político detentor de mandato ter sido julgado ainda. Curiosamente, o primeiro réu da Lava Jato com foro privilegiado no STF, Eduardo Cunha, já foi condenado por Sergio Moro e teve sua condenação confirmada pelo TRF4 após ele ter perdido a prerrogativa de foro com a cassação de seu mandato. Mas ainda respondem a ações penais da Lava Jato no STF quatro políticos: o deputado federal paranaense Nelson Meurer, do PP, é réu desde junho de 2016; a senadora petista Gleisi Hoffmann, desde setembro de 2016; o senador peemedebista Valdir Raupp virou réu em março deste ano; e o senador e ex-presidente Fernando Collor, em agosto.

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E ainda há mais uma dúzia de denúncias já oferecidas pela PGR, esperando que a Segunda Turma do STF decida se os denunciados devem virar réus. E a decisão mais recente a esse respeito foi um balde de água fria: em 18 de dezembro, Gilmar Mendes e Dias Toffoli derrotaram Fachin e o falecido Zavascki, rejeitando denúncias contra o senador Benedito de Lira (PP-AL) e os deputados federais Arthur Lira (PP-AL, filho de Benedito), Dudu da Fonte (PP-PE) e José Guimarães (PT-CE).

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O conjunto da obra da Lava Jato no Supremo infelizmente reafirma a impressão de que o foro privilegiado realmente é um trampolim para a impunidade. O termo, recorde-se, é extraoficial: formalmente, fala-se em “prerrogativa de foro” para definir o direito de autoridades serem julgadas por tribunais superiores (ou pelos Tribunais de Justiça, no caso, por exemplo, de secretários e deputados estaduais). O caráter de “privilégio” atribuído a essa regra não nasceu com a Lava Jato, é claro: foi construído ao longo de anos. O julgamento do mensalão representou uma esperança de que esse dique fosse rompido, mas foram necessários longos anos entre a divulgação do esquema de corrupção e as sentenças contra os mensaleiros no Supremo. Esperava-se que a Lava Jato avançasse nesse sentido, e ainda há oportunidade para tal. Esperamos que o país não tenha de renovar, no ainda distante 31 de dezembro de 2018, o mesmo desejo feito no fim de 2016 e que volta a fazer neste fim de ano.