“Melhor assim.” Segundo informações de bastidores, essa teria sido a reação da presidente Dilma Rousseff e de alguns assessores próximos após a notícia de que Eduardo Cunha tinha acolhido um dos pedidos de impeachment protocolados na Câmara dos Deputados. À primeira vista, uma reação estranha: como a presidente poderia estar demonstrando alívio diante da notícia de que seu mandato estaria em risco?
Mas há método na aparente loucura. De fato, a observação faz sentido de um ponto de vista muito importante: o econômico. Como recordamos neste espaço dias atrás, o país vive uma crise dupla. Primeiro, veio a deterioração dos indicadores econômicos, provocada pelas decisões erradas e erráticas tomadas pelo lulopetismo, que imaginava que seriam eternos os tempos de bonança. Ledo engano: os desacertos da política econômica devolveram o país ao mundo da inflação e dos juros altos, à perda do grau de investimento, à recessão e ao desemprego. Só depois é que veio a crise política, o embate entre Dilma e Cunha, que ora tinha seus momentos mais ásperos, ora parecia arrefecer. No meio disso, os pedidos de impeachment cuja apreciação Cunha protelava – até agora.
Entre a vitória do impeachment, a derrota do impeachment ou a indefinição, o terceiro cenário é considerado o pior
As duas crises passaram a se alimentar mutuamente, vitaminadas uma pela outra. Não se resolve uma crise se não se encontrar uma solução para a outra agora. Brasília dorme e acorda pensando no impeachment – em como escapar dele, ou em como concretizá-lo. Mesmo as votações do ajuste fiscal ficam subordinadas ao cálculo político, de quem ganha ou perde, de como as decisões podem apressar ou espantar o impeachment. Disso resulta que a solução da crise política é o passo necessário para a resolução da crise econômica. Que finalmente se decida se o Brasil seguirá até 2018 com Dilma ou com Michel Temer, pois este é o impasse que impede as forças políticas de se concentrarem em tirar o Brasil do atoleiro econômico. É nesse sentido que se pode interpretar o “melhor assim”.
É a mesma avaliação das entidades do setor produtivo do Paraná, ouvidas pela Gazeta do Povo em reportagem publicada na sexta-feira. Entre a vitória do impeachment, a derrota do impeachment ou a indefinição, o terceiro cenário é claramente considerado o pior deles. “Esta demora está afundando a economia (...) É necessário que se julgue de forma correta, mas não podemos mais ficar nessa paralisia”, disse o presidente da Fiep, Edson Campagnolo.
Obviamente isso não significa que os outros dois cenários sejam iguais. A manutenção de Dilma pode até lhe dar mais respaldo para governar, mas não exclui a possibilidade de novas denúncias e novos fatos que voltem a ameaçar seu posto no futuro; além disso, seu ideário estatizante e gastador já se mostrou fracassado. Em contraponto a ele, o programa liberal divulgado pela Fundação Ulysses Guimarães, do PMDB, seria uma lufada de ar fresco na economia nacional, mas enfrenta oposição dentro do próprio partido. O mercado financeiro deu um sinal, mostrando ânimo após a decisão de Cunha, com queda do dólar e alta do índice Bovespa na quinta-feira (os ganhos acabaram devolvidos na sexta-feira, mas a motivação veio dos dados norte-americanos, que apontam para uma iminente alta dos juros nos EUA).
A definição sobre quem comandará o país nos próximos anos, independentemente do seu desfecho, terá essa capacidade de “limpar a área” para que se possa discutir a recuperação econômica. Antes disso, por mais que o Congresso não deixe de votar orçamentos e impostos, tudo estará subordinado ao impeachment, atrapalhando um julgamento mais claro sobre o mérito das medidas propostas para tirar a economia da crise.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura