Cientes de que a proposta original da reforma da Previdência tinha sofrido algumas alterações importantes durante sua tramitação na Câmara dos Deputados, os senadores decidiram elaborar o que ficou conhecido como “PEC Paralela”, para fazer as correções que julgassem necessárias sem ter de alterar a PEC 6/2019 e acabar devolvendo-a aos deputados. Na terça-feira, dia 19, o Senado concluiu a tramitação da PEC 133/2019, como foi formalmente chamada a PEC Paralela, com a votação em segundo turno. Agora, o texto segue para a Câmara.
Um destaque acrescentado ao fim do primeiro turno de votação altera de forma importante o cálculo da aposentadoria e desidrata um pouco mais a proposta original da equipe econômica do governo. Na reforma da Previdência, o benefício é calculado levando em conta a totalidade das contribuições feitas pelo trabalhador. O texto que o Senado aprovou retoma a regra que valia antes da promulgação da reforma, considerando a média das 80% maiores contribuições. Isso significa que o cálculo será mais benéfico ao trabalhador, deixando de fora parte dos salários mais baixos, recebidos normalmente em início de carreira ou em momentos de dificuldade econômica. A regra dos 80% valerá para quem se aposentar até o fim de 2021; entre 2022 e 2024, o cálculo passa a usar 90% dos maiores salários e, por fim, a partir de 2025, valem os 100%, como desejava o governo e como constava da PEC 6/2019. Isso reduzirá em R$ 20 bilhões a economia prevista, mas podia ser pior, já que a emenda original previa uma transição de dez anos, em vez de cinco, como acabou prevalecendo. Além disso, há medidas na PEC 133 que aumentam a arrecadação previdenciária, algumas das quais tinham sido acertadas como contrapartida por desidratações feitas na reforma original.
Mais cedo ou mais tarde, será preciso rediscutir idades mínimas, ou mesmo a adoção de um sistema de capitalização
O tema mais importante da PEC 133, no entanto, é outro: os senadores incluíram a possibilidade de estados e municípios aderirem às mesmas regras de aposentadoria que estão valendo para os servidores na esfera federal. Ela não chega a impor essa adesão, limitando-se a facilitá-la, por meio de lei ordinária aprovada nas Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, em vez de exigir mudanças constitucionais. A mudança vem em momento mais que necessário, pois muitos estados e municípios vêm relutando em reformar seus sistemas de previdência, temendo as consequências eleitorais da oposição dos servidores. Mas não faltam estudos, como os da Instituição Fiscal Independente, mostrando que, no médio e longo prazo, os resultados da inação incluirão a quebra pura e simples das previdências estaduais e municipais, com consequências não apenas para os inativos, mas para toda a população.
O desafio será manter os estados e municípios na PEC 133, já que foram os deputados que retiraram os entes subnacionais da reforma original. O texto aprovado pelos senadores, no entanto, é uma versão amenizada em relação ao desejo do governo. Na PEC 6, a inclusão de estados e municípios era automática; agora, ela é facultativa e pode até mesmo ser revertida. Este caráter opcional deve mitigar resistências entre os deputados, deixando como maior obstáculo a proximidade das eleições municipais de 2020, em que muitos membros da Câmara serão candidatos a prefeito, ou pelo menos devem influenciar a disputa em suas bases eleitorais, e terão de escolher entre defender a responsabilidade fiscal ou ceder ao lobby dos servidores e manter armada a bomba-relógio previdenciária.
Mesmo com a eventual aprovação da PEC Paralela na Câmara, sobrarão arestas para serem aparadas no futuro, especialmente se não houver alguma mudança radical no perfil demográfico brasileiro. A população está envelhecendo e vivendo mais. Com isso, a proporção entre idosos, que recebem os benefícios, e trabalhadores da ativa, cujas contribuições bancam as aposentadorias atuais no sistema de repartição, continuará mudando lentamente na direção da insustentabilidade do regime previdenciário. Mais cedo ou mais tarde, será preciso rediscutir idades mínimas, ou mesmo a adoção de um sistema de capitalização, talvez com a implantação de um modelo híbrido em que o governo garanta uma renda mínima e o restante seja complementado por meio das contribuições feitas pelo trabalhador durante a carreira. Mesmo assim, não se pode negar os méritos desta que é a mais abrangente reforma previdenciária feita no país. Ainda que imperfeita, ela era necessária e oferece um respiro temporário para que o país possa discutir com alguma calma as maneiras de finalmente deixar para trás os anos de rombo fiscal e gerar crescimento sustentável.
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