Os senadores aliados da presidente afastada Dilma Rousseff pediram, a Comissão Especial do Impeachment negou, a “tropa de choque” foi ao STF e o presidente da corte, Ricardo Lewandowski, autorizou uma perícia realizada por técnicos do Senado. Nunca saberemos se a estratégia dos petistas e aliados era apenas enrolar o processo, ou se eles realmente confiavam em um resultado que desmentisse o que o país inteiro conhece a respeito dos crimes de responsabilidade cometidos por Dilma. De qualquer modo, o resultado nem teve a capacidade de atrasar demais o impeachment, nem inocentou a presidente afastada – pelo contrário, confirmou sua culpa.
“Há ato comissivo da exma. Sra. Presidente da República na edição dos decretos, sem controvérsia sobre sua autoria” – a afirmação taxativa dos peritos do Senado se refere aos decretos que abriram crédito suplementar sem autorização prévia do Congresso, justamente um dos crimes de responsabilidade de que Dilma é acusada no processo de impeachment. Como se não bastasse encontrar as digitais de Dilma na prova do crime, o próprio documento se encarrega de demolir um dos argumentos da defesa, o de que não houve violação da lei orçamentária porque, no fim das contas, a meta fiscal foi alterada posteriormente: “Se o ato de abertura de créditos suplementares ocorresse à revelia do cenário fiscal presente à época de sua edição, para, em momento futuro, ser convalidado pela limitação expressa nos decretos de contingenciamento, a letra da lei torna-se-ia inócua”. Eis um dos grandes danos das gambiarras orçamentárias de Dilma: elas não apenas enganaram um país inteiro quanto à situação dos cofres públicos, mas tinham o objetivo deliberado de burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Não há nada que permita dar crédito ao discurso do “golpe”
A própria Dilma e seus defensores, falando após a divulgação do resultado da perícia, destacaram a outra conclusão importante do documento: a de que não foi encontrado “ato comissivo” de Dilma nas “pedaladas fiscais”, as operações de crédito entre o Tesouro Nacional e o Banco do Brasil em que a instituição estatal arca “do próprio bolso” com repasses por não ter recebido a verba que deveria ter sido enviada pelo governo. “Eis a prova de que o impeachment é o golpe”, disseram os petistas – omitindo, claro, a constatação da participação da presidente afastada nos decretos. Mas até onde se pode levar em consideração a observação dos peritos?
Júlio Marcelo de Oliveira, procurador do Ministério Público de Contas junto ao TCU, matou a charada. Em entrevista ao site O Antagonista, ele explicou que as “pedaladas” não são tanto uma ação, mas uma omissão. “Os motivos que levaram o TCU a repudiar os empréstimos ilegais (...) não foram atos ostensivamente praticados pela presidente ou seus auxiliares, mas a falta de atos, justamente a omissão de pagamentos devidos aos bancos federais”. O Tesouro devia fazer os repasses aos bancos estatais, e não fez. É o tipo de fraude que consegue efeitos “sem a prática ostensiva do ato”, afirma. Daí os peritos não terem encontrado o “ato comissivo”.
Mas como acreditar que Dilma não sabia de operações com tamanho impacto sobre o orçamento federal, ou que não tenha dado seu aval às “pedaladas”? Como alegar que tudo foi feito sem seu conhecimento ou permissão quando, no início de 2013, o Tribunal de Contas da União já havia avisado o governo sobre as “pedaladas” e seus efeitos, alerta que foi repetido ao longo daquele ano e de 2014? “Não se poderia imaginar que tamanha manobra pudesse ocorrer sem o conhecimento pleno e anuência de sua principal beneficiária”, disse Oliveira a O Antagonista.
Ainda que não se queira usar essa linha de raciocínio – o que seria uma insensatez, diante da óbvia responsabilidade da presidente – para condenar Dilma no caso das “pedaladas”, a perícia atesta de forma irrefutável sua participação no caso dos decretos. As condições exigidas pela Constituição e pela Lei 1.079/1950 estão postas, o crime de responsabilidade está comprovado, o rito estabelecido pelo STF está sendo seguido. Não há nada que permita dar crédito ao discurso do “golpe”, que só perdura pela má-fé dos que nele insistem. Que venha a cassação definitiva.