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Editorial

A perseguição abortista no CNJ

Sessão do CNJ que instaurou processo administrativo contra juíza Joana Zimmer. (Foto: Rômulo Serpa/CNJ)

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Em que mundo uma juíza, usando da discricionariedade que a lei e os códigos processuais lhe concedem, age com extrema delicadeza, seguindo parâmetros internacionalmente estabelecidos, para tentar salvar as duas vidas envolvidas em uma situação limítrofe, e mesmo assim é perseguida por fazer o que fez? No mundo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que acaba de abrir processo administrativo disciplinar (PAD) contra a juíza Joana Ribeiro Zimmer, responsável pelo caso de uma pré-adolescente de 11 anos que buscava autorização judicial para um aborto que encerraria uma gravidez resultante de estupro. O episódio, ocorrido em maio de 2022 e revelado no mês seguinte, gerou comoção nacional, boa parte dela manipulada pela seleção cuidadosa de imagens de uma audiência, vazadas com o objetivo de jogar a opinião pública contra Zimmer e a promotora Mirela Dutra Alberton.

No vídeo vazado para a imprensa (um ato por si só passível de investigação, por expor uma menor de idade e violar o segredo de Justiça que envolve tais processos), que traz alguns poucos minutos da audiência e não sua totalidade, juíza e promotora conversam com a pré-adolescente. Ela descobrira a gestação naquele maio de 2022 e buscara, então, um hospital de Florianópolis, que no entanto recusou-se a realizar o aborto porque a gestação já havia ultrapassado o limiar de 21 semanas e seis dias a partir do qual se estabelece a chamada “viabilidade fetal”: a possibilidade de o bebê sobreviver fora do útero materno, desde que receba todos os cuidados necessários para que se complete o seu desenvolvimento. Joana Zimmer e Mirela Alberton sugerem (jamais impõem ou induzem) à menina que aguarde poucas semanas, uma ou duas, apenas para que a criança possa evoluir um pouco mais e tenha melhores chances de sobrevivência assim que fosse feita a antecipação do parto, o que a pré-adolescente aceita – posteriormente, ela acabaria mudando de ideia e optando pelo aborto, quando a gestação já havia chegado a sete meses.

Uma análise isenta há de concluir que Joana Zimmer agiu dentro da lei, com todo o cuidado possível, tendo em vista a preservação de todas as vidas em jogo

Este limiar de quase 22 semanas, é preciso ressaltar, não é nenhum critério legal brasileiro inventado de forma arbitrária, mas sim um parâmetro internacional, recomendado pela Organização Mundial da Saúde, e que o Ministério da Saúde brasileiro contemplara ao menos desde 2012, ainda durante o governo Dilma Rousseff, cuja simpatia pela legalização do aborto era pública e notória. A recomendação, nestes casos, não é a realização do aborto, mas a antecipação do parto seguida pela oferta de todos os cuidados médicos necessários, como o uso de uma UTI neonatal, para dar à criança a chance de sobreviver. Em outras palavras, o que tanto Joana Zimmer quanto Mirela Alberton fizeram foi seguir as normativas das autoridades sanitárias e, diante da possibilidade de salvar as duas vidas, a da mãe (para quem a gestação, até o momento, não oferecia risco de vida, segundo laudo dos médicos de Florianópolis) e da criança (que já havia atingido a “viabilidade fetal”), oferecer as condições para que isso de fato ocorresse, inclusive com o futuro encaminhamento do bebê para adoção, já que a pré-adolescente deixou claro que não desejava ficar com o filho – o que, dadas as circunstâncias, era muito compreensível.

Pois tudo isso, para o corregedor-geral Luís Felipe Salomão (que também é ministro do Superior Tribunal de Justiça), representou “violência institucional”. Uma avaliação que ignora uma série de fatos, desde a própria maneira cuidadosa como Joana Zimmer tratou a pré-adolescente até toda a rede de manipulação midiática criada para fortalecer a narrativa abortista, recorrendo até mesmo à omissão de informações importantes sobre o caso, como a identidade do estuprador e o fato de ele estar dentro da casa da menina, o que justificaria sua remoção para um abrigo. Tudo isso ficou atestado após a investigação realizada por uma CPI da Assembleia Legislativa de Santa Catarina; “a família envolvida no caso foi vítima de uma rede que incentiva a prática do aborto de forma indiscriminada, rede composta por profissionais de saúde, advogados e veículos de ‘imprensa’”, disse à Gazeta do Povo a deputada estadual Ana Campagnolo, relatora da CPI, no fim de dezembro de 2022.

É possível que Joana Zimmer – hoje trabalhando em outra comarca catarinense – acabe inocentada? Certamente que sim, e este seria o desfecho mais lógico para um caso como este, mas podemos dizer que a mera abertura do PAD já é sinal de que há um ativismo ideológico dentro do Judiciário que está disposto a desconsiderar os elementos concretos do episódio em questão para fazer avançar uma agenda específica. Não há como passar despercebido o fato, que Salomão incluiu em seu voto pela instauração do processo disciplinar, de os conselheiros terem conjecturado que a juíza agiu movida por convicções religiosas, o que não aparece em momento algum do vídeo vazado, nem nos autos do processo. Uma análise isenta há de concluir que Joana Zimmer agiu dentro da lei, com todo o cuidado possível, tendo em vista a preservação de todas as vidas em jogo. Não há como puni-la por simplesmente cumprir seu dever.

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