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Editorial

A política econômica incerta do novo governo

Fachada do Ministério da Economia, na Esplanada dos Ministérios. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Bras)

A economia não é uma ciência exata, especialmente em sua vertente de política econômica, quanto às medidas de atuação do governo e as normas de regulação do mercado e intervenção no cotidiano operacional das pessoas, empresas e instituições. Ainda que haja inúmeras questões técnicas de natureza macroeconômica que já foram testadas nos últimos 300 anos e sobre as quais se conhecem causas e efeitos, há outras questões incursas nas opções de natureza política que podem ir em uma ou outra direção, com efeitos não exatos e todos válidos. Entre as questões técnicas beirando às ciências exatas está a relação entre o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB) expresso em valores monetários e o volume de meios de pagamento em circulação. Se a expansão monetária for maior que o aumento do PIB por anos seguidos, inevitavelmente a inflação aparece, corroendo o poder de compra da moeda, empobrecendo os assalariados, desorganizando o sistema de preços e, ao fim, jogando a economia em recessão.

Sobre esse primeiro ponto – o controle do estoque de moeda circulante vis-a-vis o desempenho do PIB –, é essencial que Lula e sua equipe deixem claro como será comandada a área econômica, quem estará à frente da política monetária e as demais medidas que o governo pretende implantar. Se em 2018 o Brasil sabia desde o minuto seguinte à vitória de Jair Bolsonaro que a economia estaria a cargo do liberal Paulo Guedes, hoje o arco de possibilidades vai de economistas defensores da responsabilidade fiscal até o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, nome que já deixou o mercado financeiro alarmado nos últimos dias. As escolhas para a equipe de transição também não ajudam a prever o rumo futuro, pois, se por um lado ela tem dois “pais do real” (André Lara Resende e Pérsio Arida), por outro conta também com um ex-ministro gastador (Nelson Barbosa) e pode, ainda, ter Guido Mantega, a julgar por declarações do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin.

O Brasil elegeu um candidato conhecido e uma política econômica desconhecida, cenário esse que contribui para criar um vácuo de dúvidas, incertezas e receios

Enquanto não realiza tais definições, o governo eleito contribui para aumentar as incertezas e, como consequência, induz a certa retração nos investimentos privados e pisada no freio dos negócios nacionais, sem os quais o PIB não cresce. Em um país que vem de duas crises graves – pandemia e seca prolongada –, tudo o que um presidente eleito não devia fazer é manter o país em suspense, no mínimo porque um PIB estagnado ou em crescimento lento produz o pior dos males sociais: o desemprego, que vem regredindo até o momento.

Se o próprio Lula não toma a iniciativa de eliminar as dúvidas, a sociedade em geral e os agentes de mercado em particular precisam redobrar a cobrança sobre o eleito para que diga logo qual é o plano de seu governo nessa questão. Vale lembrar que recentemente o Brasil aprovou legislação regulamentando o mandato da diretoria do Banco Central, de forma que a atual diretoria tem ainda dois anos de mandato. Como o atual presidente do banco, Roberto Campos Neto, desfruta da credibilidade do mercado e também no meio político, o normal seria estar claro para todos que ele e seus diretores seguem até o fim de seu mandato. O problema é que o Brasil não é um país habituado a seguir o normal e as leis vigentes, embora o então candidato Lula tivesse se pronunciado a favor da manutenção dos atuais dirigentes do Banco Central, conforme reza a lei.

Um segundo aspecto relevante para indicar o futuro da economia é a política fiscal, especialmente o que o governo pensa sobre o equilíbrio das contas públicas e o controle do déficit. Como ao longo da campanha Lula fez inúmeras declarações contra o teto de gastos, que limita a gastança do governo, há preocupações sobre o que realmente seu governo irá fazer, especialmente depois que começaram as negociações para a PEC da Transição. A boa gestão das contas do governo tem a ver no mínimo com duas questões essenciais para a saúde econômica do país: a inflação, pois déficits públicos crônicos são financiados por emissão de moeda ou aumento da dívida pública; e as taxas de juros, porque, se houver expansão monetária e inflação, o Banco Central eleva os juros para combatê-la ou, se o déficit for financiado por mais empréstimos tomados pelo governo, diminuem os fundos disponíveis para financiamento ao setor privado e, portanto, ocorre pressão altista sobre a taxa de juros.

O terceiro aspecto importante se refere ao fato de, caso o governo mantenha a gastança e despreze o teto de gastos, começarem ameaças para elevar impostos destinados a bancar o crescimento dos gastos públicos. A carga tributária efetivamente arrecadada pelo governo (municípios, estados e União) atingiu a marca dos 34%; logo a carga nominal é muito maior e já chegou ao limite técnico aceitável, acima do qual a tributação passa a atuar como inibidora do crescimento do PIB. Nesses três pontos, além de outros, não existe compromisso público firmado e explicado em detalhes pelo presidente nem por seus assessores conhecidos durante o período eleitoral. Lula foi eleito sem que a população soubesse qual é seu plano de governo, embora se conheçam suas ideias gerais e o que foram seus dois mandatos anteriores na Presidência, em grande parte dominados por corrupção sistêmica e constante.

O Brasil elegeu um candidato conhecido e uma política econômica desconhecida, cenário esse que contribui para criar um vácuo de dúvidas, incertezas e receios. Um cenário de incertezas e falta de definições em geral freia o ímpeto empreendedor e leva à suspensão, definitiva ou temporária, de investimentos. É hora de o governo eleito dizer a que veio e o que pretende fazer no amplo espectro da economia.

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