A crise financeira mundial e os graves erros cometidos pelos bancos, ao concederem financiamentos em valores exageradamente elevados em comparação com o tamanho do capital próprio, expôs as deficiências nas regras de regulação do sistema. Houve bancos que realizaram empréstimos de 40 dólares para cada dólar de capital próprio dos acionistas, relação que é conhecida como "índice de alavancagem". Esse índice é considerado grande demais, pois dispensa os banqueiros e os acionistas de aportarem mais recursos próprios se quiserem ver o crescimento da sua instituição. Alguns especialistas afirmam que um índice de alavancagem razoável deveria ficar em torno de 12; isto é, o banco somente poderia efetivar operações de financiamentos em volume equivalente a 12 vezes o capital próprio.
Com índice de alavancagem bem menor do que aqueles 40 dólares por um, o banco teria de ser bem mais rigoroso na aprovação de crédito, exigindo melhores garantias e mais rigidez quanto à capacidade de pagamento do tomador do empréstimo. Outro efeito benéfico da redução da alavancagem seria melhorar a competição dos bancos pela captação de recursos de depositantes. Se um banco puder emprestar apenas 12 vezes o valor do seu próprio capital, os depósitos captados de clientes acima dessa faixa devem ser recolhidos ao Banco Central, desestimulando as disputas predatórias por clientes e depósitos.
Outro efeito notado depois que a crise mostrou todas as suas faces é a má qualidade das operações de empréstimos, com destaque para os financiamentos feitos com garantias frágeis ou insuficientes, para clientes com baixa capacidade de pagar a dívida. A crise mostrou a omissão dos órgãos reguladores quanto às exigências mínimas que os bancos devem cumprir na concessão de operações de empréstimos e financiamentos. Deixados soltos, os bancos saíram emprestando dinheiro sem critério, para clientes que não conseguiram pagar, fazendo que a inadimplência generalizada, que se iniciou com as dívidas derivadas de financiamentos da casa própria, se transformasse em problema das pessoas e das nações, e não apenas dos bancos.
Que os bancos foram os responsáveis por más práticas financeiras não há dúvida. Porém, os órgãos de regulação e fiscalização são culpados por deixarem o sistema financeiro livre para fazer o que bem quiseram, sem leis e normas capazes de evitar o colapso que se viu. O questionamento que fica é se os órgãos de regulação serão capazes de cortar as práticas responsáveis pelo colapso e refazer as regras, de forma a imporem exigências rigorosas, em especial quanto às operação com derivativos. Não há como reduzir as probabilidades de ocorrerem novas tragédias sem o estabelecimento de novas regras para o sistema financeiro, mais duras e mais restritivas.
Banco é uma instituição que tem o poder de multiplicar a moeda em circulação e suas crises provocam perdas e sofrimentos para a nação muito superior ao prejuízo dos banqueiros e seus acionistas. Nessa confusão, dois problemas de difícil confrontação agem para atrasar ou até mesmo impedir a reforma regulatória. O primeiro refere-se ao poderoso lobby dos banqueiros e executivos financeiros sobre o sistema político e sobre os órgãos reguladores. O segundo está em que as autoridades econômicas e os dirigentes dos bancos centrais e dos órgãos encarregados de fixar a regulação são recrutados, em boa parte, entre banqueiros e executivos do mercado financeiro. A complexidade do sistema financeiro e a sofisticação das operações bancárias atingiram grau tão elevado que raros são os políticos e governantes capazes de deter os conhecimentos do assunto e de compreender os meandros do mundo das finanças.
Recentemente foi aprovado o acordo da Basileia 3, pelo qual novas regras e novas exigências foram definidas, criando limitações ao poder dos bancos de criar dinheiro e fazer operações de baixa qualidade. A exigência de maior volume de capital dos banqueiros e seus acionistas, a redução dos limites menores para a multiplicação de empréstimos, a redução do índice de alavancagem, a observância de condições mais rigorosas para a aprovação de financiamentos e um freio na procriação de derivativos financeiros são algumas das regras que podem melhorar o funcionamento do sistema e agir para prevenir as crises.
Apesar dos aspectos positivos das novas regras, ainda falta definição sobre alguns pontos, como a concessão de financiamentos acima da capacidade financeira dos devedores e a obrigatoriedade dos bancos em contribuírem para um fundo garantidor de perdas. Sem uma reformulação profunda e extensa nas normas que regulam o funcionamento dos bancos, a prevenção de crises será frágil e situações trágicas típicas dessas crises podem se repetir, com toda sorte de males e custos que elas impõem a toda a população.
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