Desde o fim de 2016, o Congresso conta com uma Instituição Fiscal Independente (IFI), formada por analistas que divulgam estatísticas, analisam indicadores fiscais e sua adesão às metas de governo, e medem o efeito de medidas governamentais nas contas públicas. Entre suas publicações está o “Relatório de Acompanhamento Fiscal”, divulgado mensalmente. Se os senadores e deputados efetivamente o leem, não se sabe. Mas deveriam – especialmente a edição de maio, que traz em seu resumo a seguinte frase: “Aprovação da reforma da Previdência é condição necessária para sobrevivência do teto de gastos”.
O raciocínio não é tão complicado. A nova regra sobre o teto de gastos do poder público afirma que eles não podem crescer acima da inflação. No entanto, várias despesas do governo têm uma “dinâmica própria” – muitas vezes aumentam a taxas maiores que os índices de preços. Uma dessas despesas é justamente a da Previdência. Segundo as contas da IFI, se não houver reforma nenhuma, já em 2022 os gastos com aposentadorias, pensões e outros benefícios chegarão a 51% das despesas sujeitas ao teto e o governo não terá mais nenhuma “margem fiscal”, resumidamente definida como a “folga” que o poder público tem para cortar despesas, já que há várias rubricas orçamentárias que não admitem redução. Com a reforma da Previdência, esse patamar seria atingido três anos depois, em 2025 – mas os especialistas alertam que sua conta considerava a proposta original da reforma; alterações podem reduzir essa “vida útil” da margem fiscal, uma conta que a IFI promete entregar em junho.
Mesmo com a reforma da Previdência, permanece a obrigação de uma contenção de gastos que não seja meramente figurativa
Em outras palavras, se a despesa total do Poder Executivo só pode crescer a uma determinada taxa e os gastos da Previdência aumentam em velocidades maiores, isso significa que as aposentadorias “comerão” uma porcentagem cada vez maior do orçamento, e aí será preciso tirar dinheiro de outras rubricas. A questão é que a reforma da Previdência desacelera esse processo, dando ao poder público mais tempo para rearranjar seus gastos. E aqui está o recado da IFI não aos parlamentares, mas ao governo federal: mesmo com a reforma da Previdência, permanece a obrigação de uma contenção de gastos que não seja meramente figurativa. É urgente que a inchada máquina estatal seja reduzida, eliminando estruturas supérfluas e privilégios que em nada colaboram para o bem-estar da população.
Não se trata de ideologia, mas de matemática, como afirmou recentemente o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. É ela que mostra a inviabilidade da manutenção do sistema atual, em que cada vez menos trabalhadores na ativa e formalizados sustentam cada vez mais aposentados. Desde a aprovação da PEC do Teto, aliás, já se dizia que sua sequência natural seria a reforma da Previdência, pois, sem esta, aquela se tornaria ineficaz em pouco tempo.
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Os articuladores do governo continuam caçando pelo menos 308 votos na Câmara para poder levar a reforma da Previdência ao plenário – o ideal, em sua conta, é garantir pelo menos 320 apoios para evitar que traições de última hora levem à rejeição do texto. O alerta da IFI traz ótimos argumentos técnicos em favor da reforma da Previdência, mas corre o risco de ser simplesmente ignorado por senadores e deputados cujas preocupações são bem mais mesquinhas. Não é à toa que uma das estratégias do governo tem sido mexer em cargos de indicação política dos deputados, já que muitos deles só são “sensibilizados” desta forma.