A reforma da Previdência já foi enviada pelo governo ao Congresso Nacional e o presidente Jair Bolsonaro já se encontrou com líderes partidários para ouvir suas demandas antes do carnaval. O governo conta os votos para conseguir aprovar a reforma, que depende de mudança constitucional, ou seja, do apoio de 308 deputados e 49 senadores, enquanto a oposição diz ter até 180 votos na Câmara, bastando alguns poucos descontentes para atrapalhar a aprovação de PECs como a da Previdência. Mas um jogador importante ainda não foi convocado por Bolsonaro para apoiar sua proposta: o povo brasileiro.
Até agora, o presidente da República se dirigiu à população para defender a reforma da Previdência em apenas uma ocasião: o pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão na noite de 20 de fevereiro, após ter levado o texto da reforma ao Congresso. No Twitter, que o presidente usa como meio preferencial de comunicação com o seu eleitorado, as menções à reforma são escassas: cinco mensagens, todas publicadas entre 20 e 21 de fevereiro, de um total de pouco mais de 500 postagens desde que tomou posse, em 1.º de janeiro.
A melhor pessoa para convencer os eleitores da necessidade da reforma é o próprio presidente da República
É muito pouco para um projeto que definirá o futuro do país. Tanto que, na reunião do dia 26 com os líderes partidários, Bolsonaro ouviu a cobrança para que se envolvesse mais na batalha de comunicação em torno da proposta. Na ocasião, ele prometeu mais mensagens e transmissões ao vivo, as chamadas “lives”, para defender a reforma. Naquele mesmo dia, o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente, cobrou dos deputados do PSL o mesmo empenho na defesa da reforma que seu pai não vinha demonstrando, causando mal-estar entre os parlamentares.
Na corrida pelo apoio popular, o governo sai em desvantagem. Desde que seu antecessor Michel Temer anunciou a intenção de mudar a Previdência, a oposição usou e abusou de slogans e falácias contábeis para revoltar a população contra o que era descrito como “retirada de direitos”. O brasileiro já ouviu muitas vezes a lorota sobre a “farsa do déficit da Previdência”, o argumento de que bastaria cobrar os grandes devedores do INSS, os slogans sobre o “fim da aposentadoria” e a necessidade de “trabalhar até morrer”, pois a reforma, com suas exigências de idade mínima combinada com tempo de contribuição, tornaria a aposentadoria um sonho impossível. Um discurso falso, mas muito atraente, feito sob medida para atrapalhar o debate sobre a inviabilidade da Previdência em seu modelo atual.
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Esta foi, aliás, a única omissão relevante no pronunciamento que Bolsonaro havia feito em cadeia nacional. O presidente defendeu os méritos de sua proposta, que são reais – mesmas regras para funcionários públicos e da iniciativa privada, alíquotas progressivas que cobrarão mais de quem ganha mais –, mas não avisou os brasileiros que eles ouviriam muitas mentiras e desinformação sobre a reforma. Apenas esse alerta já teria um enorme impacto, especialmente entre aqueles que ainda não estão totalmente cientes da urgência da reforma para que o Brasil consiga as condições para um crescimento econômico consistente no médio e longo prazo.
É evidente que o eleitorado de Bolsonaro inclui brasileiros preocupados com uma gama enorme de questões, e há uma parcela de seus apoiadores que não vê a reforma da Previdência e o ajuste fiscal como prioridades, dando mais importância a outros temas. Mas, como afirmou em fevereiro o líder do PPS, Daniel Coelho, “se ele teve os votos, partimos do pressuposto que ele tem credibilidade para convencer as pessoas”. A melhor pessoa para convencer os eleitores da necessidade da reforma é o próprio presidente da República, não o ministro Paulo Guedes ou algum líder parlamentar.
No dia seguinte à reunião de Bolsonaro com os líderes parlamentares, o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, prometeu que “logo depois do carnaval o presidente vai botar o peito n’água”, em referência a uma defesa pública mais ativa da reforma da Previdência. Pois o momento chegou. Bolsonaro tem as condições para mobilizar os brasileiros que confiaram nele em outubro de 2018 em torno deste tema tão crucial. Se os parlamentares que ainda hesitam a respeito da reforma perceberem que a população está mobilizada, o governo terá mais de meio caminho andado para deixar um enorme legado para o país.
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