Teve início efetivamente nesta segunda-feira (19) o que será o primeiro grande teste político do governo Michel Temer. A proposta de emenda constitucional que cria um teto para o gasto público começou a ser avaliada por uma comissão especial do Congresso. Sua tramitação, importante para dar respaldo legal ao ajuste fiscal, deve ocorrer ainda neste segundo semestre. Sem um plano alternativo, a equipe econômica depende dessa PEC para confirmar a rota de recuperação da economia.
Nos primeiros 100 dias de gestão, Temer teve uma relação ambígua diante do Congresso. Fez diversas concessões que não combinavam com o momento de austeridade fiscal, mas esse movimento foi interpretado como um preço a ser pago pela interinidade. Na tramitação da PEC do teto do gasto, a situação será outra. O governo, confirmado o impeachment de Dilma Rousseff pelo Senado, não será mais interino e dependerá do ajuste fiscal para tocar outras demandas do país.
O projeto enviado ao Congresso prevê que os gastos públicos serão corrigidos apenas pela inflação do ano anterior, uma variável independente do crescimento da receita. No médio prazo, esse instrumento permite que o déficit público caia na medida em que a arrecadação pública cresça mais do que a inflação. A expectativa é que se produza superávit primário dentro de quatro anos se essa regra for seguida.
O mérito da proposta é que ela impõe à União uma disciplina fiscal rígida o suficiente para ser crível no longo prazo. Ela permitiria ao governo escapar de vinculações que o obrigam a gastar percentuais fixos da receita com algumas áreas, abrindo o espaço fiscal necessário para a dívida pública cair.
A ideia, no entanto, tem pontos fracos. O primeiro é sua vulnerabilidade política. As vinculações de receitas, por mais incongruentes que sejam com a boa gestão fiscal, refletem anseios fortes o suficiente para terem se tornado lei. Além disso, o plano precisa necessariamente ser casado com a reforma da Previdência. Isso porque o gasto previdenciário não pode ser limitado à inflação do ano anterior por estar sujeito a fatores fora do controle do governo. Sem uma reforma, há risco de outras áreas perderem muitos recursos para que seja respeitado o teto de gastos proposto na PEC.
Há um terceiro problema. Imposto por muito tempo, o teto de gastos pode tornar o Estado menor do que deve ser. Em um prazo acima de oito ou dez anos, quando o país já tiver recuperado sua capacidade de entregar superávits primários, a correção do gasto pela inflação fará o governo perder uma parcela significativa de sua receita em relação ao PIB. Levada por muito tempo, essa situação poderia limitar de forma desnecessária a capacidade de atuação do governo.
Diante da urgência de se reverter a trajetória das contas públicas, é realmente necessário um instrumento poderoso e com ampla abrangência como o proposto pelo governo. Ele precisa ser aperfeiçoado para permitir uma reavaliação de seus resultados ao longo dos anos e para que seja flexibilizado em momentos de necessidade, desde que não esteja ameaçada a trajetória de queda da dívida pública.
A maior dificuldade para Temer será o fato de não possuir um plano alternativo. Por isso esta será a prova de fogo para ele demonstrar que é capaz de defender com propriedade suas propostas, aperfeiçoando o texto original no processo. Ao Congresso cabe encarar de frente sua responsabilidade central de colocar as contas públicas em ordem. Se não houver consenso para este projeto avançar, os parlamentares terão de apresentar alguma solução que entregue resultado semelhante.
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