Entre os legados positivos que Jair Bolsonaro deixará para Lula na economia está a queda naquela que pode ser considerada uma das piores mazelas socioeconômicas que afetam uma nação: o desemprego. Ele vinha caindo, embora lentamente, à medida que o Brasil iniciava uma recuperação cambaleante após a pior recessão da história, a “herança maldita” lulopetista, mas deu um salto graças à Covid-19, chegando a 14,9% no trimestre móvel encerrado em março de 2021. Com o arrefecimento da pandemia e a retomada da atividade econômica, o mercado de trabalho foi se recuperando, e esse processo segue em curso, a julgar pelos dados divulgados nesta quarta-feira pelo IBGE.
A taxa de desemprego, que estava em 8,7% no trimestre móvel encerrado em setembro, caiu mais 0,4 ponto porcentual, e no período de três meses entre agosto e outubro ficou em 8,3%. É a menor taxa desde 2015, e traz uma bem-vinda reaceleração do mercado de trabalho, já que entre junho e setembro as quedas foram de apenas 0,2 ponto porcentual de um mês para o outro. A população ocupada está perto dos 100 milhões de brasileiros: hoje, são 99,7 milhões, mais um recorde na série histórica da Pnad Contínua, que começou a ser feita em 2012. Outros números positivos são a queda no número de brasileiros subocupados, subutilizados e desalentados, e a elevação no nível de ocupação (57,4%, também o mais alto desde 2015), no rendimento real e no número de trabalhadores com carteira assinada, que agora é de 36,6 milhões (ainda abaixo do recorde de 37,5 milhões registrado em 2014).
Lula não pode dar como certo que a economia seguirá crescendo e gerando empregos no mesmo ritmo atual. Como ele vai lidar com esse legado de queda no desemprego que recebe de Jair Bolsonaro?
Essa recuperação no mercado de trabalho é puxada pelo reaquecimento na atividade econômica – as estimativas para o PIB de 2022 já subiram muito desde o início do ano, e agora estão pouco abaixo dos 3%. No entanto, as perspectivas para 2023 são bem mais complicadas, e já o eram antes mesmo do desfecho da eleição presidencial. Lula não pode dar como certo que a economia seguirá crescendo e gerando empregos no mesmo ritmo atual. A pergunta é: como o petista vai lidar com esse legado que recebe de seu antecessor?
Durante a campanha, ficou célebre uma frase de Lula em um evento com cooperativas. “Precisamos, então, discutir como é que vamos criar trabalho para o povo brasileiro, para as mulheres e homens que querem estudar, trabalhar e querem ter certeza que vão construir famílias, vão ter casa para morar e vão viver uma vida digna. Como é que a gente vai responder isso? Queria dizer para vocês que eu não sei como fazer”. Por mais que ele estivesse falando em um contexto específico de automação crescente do trabalho e perda de empregos devido aos avanços tecnológicos, há um temor muito fundado de que a ignorância de Lula a respeito de como fomentar a geração de empregos seja mais ampla – ou, pior ainda, que ele conheça as respostas certas, mas não as queira colocar em prática por discordar delas.
Dois caminhos para seguir estimulando a geração de emprego formal mesmo em um ambiente de economia em desaceleração são a redução da carga tributária sobre a folha de pagamento (e, de forma mais ampla, sobre a produção e o consumo em geral) e o fomento à maior segurança jurídica nas relações trabalhistas. Esta última teve um forte impulso com a reforma trabalhista de 2017, a mesma que Lula atacou durante a campanha e que segue ameaçada, ainda que o petista tenha moderado o discurso nos últimos momentos antes do segundo turno. Quanto à carga tributária, o setor produtivo segue dependendo da renovação de desonerações pontuais, quando a melhor solução seria uma reforma tributária inteligente, que não apenas unificasse impostos, mas de fato tornasse mais barato contratar, produzir e vender.
Mas nem isso adiantará se Lula colocar em prática uma política econômica irresponsável, inflacionária e recessiva, como já alertaram até mesmo economistas que “fizeram o L” antes das eleições e agora fingem não ter colaborado para a vitória do petista ao emprestar sua credibilidade. Recuperar o mercado de trabalho nunca foi tarefa simples; sempre foi algo conquistado a muito custo. Que o petismo não ponha tudo isso a perder.
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