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Editorial

A reforma tributária avança

O deputado João Roma, relator da reforma tributária
O deputado João Roma, relator da reforma tributária na CCJ da Câmara. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Enquanto a reforma da Previdência caminha lentamente na Câmara dos Deputados, outra reforma fundamental, a tributária, parece destinada a uma tramitação mais célere, ou pelo menos mais consensual. Os parlamentares não quiseram esperar que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, enviasse seu próprio projeto, mas também recusaram a PEC 293/04, relatada pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly e que já tinha sido aprovada em Comissão Especial no fim do ano passado. O novo projeto, a PEC 45/2019, foi assinado por Baleia Rossi (MDB-SP) e mais de 170 deputados, incluindo membros da base aliada de Jair Bolsonaro. Na quarta-feira, o relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), João Roma (PRB-BA), votou pela sua aprovação; na próxima terça-feira, dia 21, a CCJ ouvirá o mentor da reforma, o economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal; no dia seguinte, deve concluir a votação.

A PEC 45/2019 unifica cinco tributos – ICMS, PIS/Cofins, ISS e IPI –, que serão gradualmente substituídos por um novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), e permite o surgimento de um Imposto Seletivo, federal, que só poderia incidir sobre determinados produtos cujo consumo se deseje desestimular, como cigarros ou bebidas alcoólicas. Neste sentido, a PEC 45/2019 é um pouco mais modesta que a proposta anterior que estava no Congresso e que unificava dez impostos (IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins, Salário Educação, Cide Combustíveis, ICMS e ISS), também prevendo o Imposto Seletivo. Em comum, esta unificação promovida por ambos os projetos tem uma característica que alguns parlamentares enxergam como problemática, pois envolve impostos federais, estaduais e municipais. Como garantir que não haja desequilíbrios na distribuição da arrecadação do IBS é um tema que os membros da CCJ pretendem esclarecer com a presença de Appy.

A simplificação, por si só, já é extremamente bem-vinda, mas não basta para uma verdadeira reforma tributária

E, se por um lado o contribuinte efetivamente deixa de pagar cinco impostos para pagar apenas um, simplificando sua vida, o texto acaba criando mais burocracia na outra ponta, a do arrecadador e administrador dos recursos. A regulamentação do IBS exigirá lei complementar; as alíquotas serão calculadas pelo Tribunal de Contas da União e aprovadas pelo Senado, podendo depois ser alteradas por estados e municípios por lei ordinária; será criado um comitê gestor nacional com representantes de União, estados e municípios para controlar a arrecadação e a distribuição da receita.

A simplificação, por si só, já é extremamente bem-vinda. O Brasil ocupa a liderança incontestável nos rankings internacionais quando o assunto é complexidade do sistema tributário e o esforço necessário em tempo e pessoal para cumprir todas as obrigações com o Fisco. Mas uma verdadeira reforma tributária também precisaria atacar pelo menos mais dois problemas: o fato de o Brasil, hoje, tributar muito mais a produção e o consumo que a renda e a propriedade, algo que prejudica os mais pobres, que gastam parte maior da sua renda com impostos; e o fato de a arrecadação estar, hoje, concentrada na União, restando fatias pequenas aos estados e municípios, entes responsáveis por serviços essenciais como educação básica, saúde e segurança pública.

A PEC 45/2019 prevê uma redistribuição da arrecadação do IBS ao longo de um período de 50 anos, mas não trata da mudança no foco da tributação; o que ela faz é criar um mecanismo para que os mais pobres tenham um tipo de restituição, realizado por meio do cruzamento de dados do CPF com os cadastros dos programas sociais. A experiência de municípios e estados que devolvem parte dos impostos a quem pede a inclusão do CPF nas notas fiscais mostrará até que ponto esse sistema será eficaz no combate à informalidade, mas desde já pode-se apontar dois problemas. Primeiro, há uma transferência da responsabilidade para o contribuinte mais pobre, que terá de lembrar sempre da necessidade de exigir a nota fiscal para que o governo saiba o valor a ser devolvido; além disso, a vinculação entre devolução tributária e cadastro em programas sociais deixa a porta aberta para fraudes em que pessoas seriam incluídas na lista de beneficiários apenas para conseguirem recuperar o IBS pago.

Como a necessidade de uma reforma que simplifique o sistema tributário brasileiro é quase que uma unanimidade, o governo terá de correr e trabalhar em extrema sintonia com sua base aliada no Congresso se quiser fazer alguma alteração na proposta de Appy. Ao patrocinar um novo projeto de reforma, o parlamento já desperdiçou todo o trabalho feito com a PEC 293/04, que chegou a estar pronta para votação em plenário; voltar à estaca zero mais uma vez só se justificará se a equipe econômica tiver uma ideia radicalmente diferente e muito melhor que a atual.

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