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Editorial

A reforma tributária divide os empresários

Empresários na coletiva de imprensa que lançou o movimento contrário à reforma tributária prevista nas PECs 45 e 110. (Foto: Divulgação/Associação Comercial de São Paulo)

Por mais consensual que seja a necessidade de uma reforma tributária no Brasil, a sua tramitação no Congresso será mais difícil que o imaginado, graças a um racha dentro do empresariado nacional. Enquanto uma ala, formada principalmente por multinacionais e pelo setor industrial, defende a simplificação de tributos nos moldes propostos pelas PECs 45 e 110, outro grupo também defende a simplificação, mas com desoneração da folha de pagamento e sua possível substituição por um imposto aos moldes da antiga CPMF – é a posição do comércio, do setor de serviços e de grupos como o Brasil 200, liderado por Flávio Rocha, dono da rede Riachuelo.

O que mobiliza os dois lados deste embate não é a distribuição da arrecadação entre União, estados e municípios, hoje tremendamente desequilibrada em favor de Brasília, deixando muitos entes subnacionais em situação fiscal crítica – esta batalha ficará a cargo de governadores e prefeitos, já que em todos os modelos previstos a simplificação unificará impostos federais, estaduais e municipais em um único tributo, o que levará a longas discussões sobre como o dinheiro arrecadado será dividido. O que coloca empresários uns contra os outros é a perspectiva de pagar mais ou menos impostos em comparação com o que ocorre atualmente, em nosso sistema disfuncional.

Independentemente da posição vencedora, o grosso da arrecadação continuará vindo da produção e do consumo, em uma estrutura que sempre pune os mais pobres

A unificação proposta pelas PECs não atinge apenas os tributos, mas também as alíquotas – o que, entre outros efeitos, pode acabar com a chamada “guerra fiscal”. E é aqui que reside a controvérsia. Os representantes da indústria alegam que seu setor paga impostos demais e por isso perde competitividade interna e externa, enquanto outros ramos da economia são subtributados, e o ideal seria equalizar o que consideram uma distorção. O grupo contrário às PECs coloca ênfase não na isonomia, mas geração de empregos, ressaltando que as propostas vão onerar setores que respondem por 80% do mercado de trabalho nacional – comércio, serviços, construção e agronegócio. A elevação da tributação em alguns desses ramos resultaria em aumento da informalidade e, consequentemente, menor arrecadação, além de atrapalhar a geração de empregos – daí a defesa da desoneração da folha, compensada pela “nova CPMF”. Este bloco ganhou o apoio do ex-secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, demitido justamente por sua defesa de um imposto sobre transações financeiras.

Neste tipo de disputa, independentemente de quem vença, continuará mantido um dos problemas estruturais do sistema tributário brasileiro. Mesmo que parte dos impostos hoje pagos pela indústria passe a ser bancada por outros setores, ou ainda que haja alguma desoneração da folha de pagamento em troca de um novo tributo, o grosso da arrecadação continuará vindo da produção e do consumo, em uma estrutura que sempre pune os mais pobres. Isso porque o valor pago em impostos sobre um produto ou serviço depende do seu preço, e não da classe social do contribuinte – o imposto que não fará falta quando um rico adquire um item pode fazer a diferença para o pobre que compra o mesmo produto.

A comissão mista do Congresso, com 25 deputados e 25 senadores, já foi criada pelos presidentes das duas casas, começando suas reuniões em 3 de março. Ela tem prazo de 45 dias para apresentar uma proposta unificada, harmonizando as duas PECs já existentes e as propostas que o governo eventualmente apresentar; outros agentes, como o próprio Brasil 200, só conseguirão se fazer ouvir se tiverem força política para levar suas propostas à comissão. No entanto, o leque de possibilidades exposto até agora só permite imaginar que a prioridade será mesmo a simplificação e talvez algum tipo de substituição, caso se opte pela desoneração da folha. Com poucas alterações na tributação sobre patrimônio e renda, e a manutenção da ênfase na arrecadação sobre produção e consumo, a reforma tributária certamente trará avanços, mas não será tão profunda a ponto de estabelecer no país uma verdadeira justiça tributária, em que paga mais quem tem mais.

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