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Editorial

A reforma tributária “fatiada” e seus problemas

O ministro Paulo Guedes entrega a primeira fase da reforma tributária do governo a Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia; segunda fase é prometida até o fim de setembro. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

A equipe econômica do ministro Paulo Guedes promete ainda para setembro a entrega da segunda fase da reforma tributária. As propostas, que ainda precisam do aval do presidente Jair Bolsonaro, incluiriam desoneração da folha de pagamento, aumento na faixa de isenção do Imposto de Renda e o novo imposto sobre pagamentos, semelhante à antiga CPMF. A primeira parte foi enviada ao Congresso quase dois meses atrás, e continha apenas a unificação do PIS e da Cofins na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), um tipo de imposto sobre valor agregado. Há uma pergunta que se impõe neste momento, como aliás já se impunha desde o envio da primeira etapa: e o resto?

Há uma diferença bastante significativa entre a reforma tributária e a outra reforma “fatiada” que o governo está mandando ao Congresso, a administrativa. No caso desta, é possível defender que as fases seguintes dependem da aprovação da primeira. Só quando passar a alteração constitucional que reformula o serviço público seria possível adentrar nos detalhes, como a nova estrutura de cargos e salários, e por isso o governo precisaria esperar o fim da tramitação da PEC para saber em que termos deverá propor a sequência da reforma.

No Brasil se tributa demais a folha de pagamentos, a produção e o consumo, enquanto se tributa pouco a renda e o patrimônio. Como o governo imagina uma divisão ideal da arrecadação nestes termos? Ninguém sabe

Não é este, no entanto, o caso da reforma tributária. Ali, seria preciso ter de imediato o panorama completo. Hoje, por exemplo, sabemos que no Brasil se tributa demais a folha de pagamentos, a produção e o consumo, enquanto se tributa pouco a renda e o patrimônio. Como o governo imagina uma divisão ideal da arrecadação nestes termos? Ninguém sabe, porque até agora tudo o que o governo propôs só unifica dois tributos em um; mesmo se as informações sobre a segunda fase se confirmarem, as mudanças continuarão afetando parte pequena do nosso emaranhado tributário.

Mas como saber se as alterações propostas agora fazem sentido sem conhecer todo o sistema que o governo quer construir? Partindo do pressuposto de que o governo não quer abrir mão de carga tributária total, e a sociedade não aceitará aumento dessa mesma carga, caso alguma mudança sugerida agora aumente ou reduza a arrecadação, não há como bem avaliar a proposta sem ter ideia de onde virá a compensação, para mais ou para menos. Imaginemos, por exemplo, que o Congresso aprove o aumento na faixa de isenção do IR, o que reduziria a arrecadação; a não ser que a contrapartida já esteja prevista nesta mesma segunda fase, o Legislativo correria o risco de aprová-la para só depois o país ser surpreendido com algum novo tributo tirado da cartola pela equipe econômica, com o argumento de que o dinheiro perdido com a mudança no IR terá agora de vir de outra fonte.

Se o governo já tem o panorama completo da reforma tributária, o correto teria sido enviá-la inteira, como aliás é o caso das PECs 45 e 110, propostas respectivamente na Câmara e no Senado. Não há “timing político” – a justificativa mais adotada por Paulo Guedes recentemente – que explique uma reforma fatiada quando seria muito melhor conhecê-la toda. A alternativa é tenebrosa: a equipe econômica ainda não sabe o que vai propor, incluindo e retirando ideias ao sabor da reação da opinião pública aos balões de ensaio lançados com frequência.

Em qualquer dos casos, uma reforma apresentada a conta-gotas só serve para emperrar a tramitação. O governo não quer ceder o protagonismo ao Congresso e diz ter uma proposta de reforma. O Legislativo demonstra paciência e boa vontade com o Executivo, mas a equipe econômica esconde o jogo, ou ao menos parte importante dele. Como resultado, nada caminha a contento: nem as PECs 45 e 110, nem as propostas do governo, muito menos uma possível unificação das três reformas, já que a do Executivo está incompleta. Enquanto isso, o contribuinte brasileiro, pessoa física e jurídica, continua preso no cipoal de normas tributárias que contribui para o desempenho medíocre do país nos rankings de liberdade econômica e facilidade de fazer negócios.

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