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Editorial

A relação entre juros e preços

Banco Central
Edifício-sede do Banco Central no Setor Bancário Norte, em Brasília. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

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Em economia, preço é a expressão monetária de um produto (bem ou serviço), direito, ativo ou coisa, representado por uma medida numérica em determinada moeda, que significa seu valor de troca, isto é, a quantia a ser paga por eventual compra, empréstimo, locação ou disponibilidade. Para compreender o funcionamento de um sistema econômico nacional, a economia é analisada segundo um modelo geral (conhecido, entre outros, pelo nome de “modelo dos agregados macroeconômicos”), que divide o sistema em quatro entidades econômicas, quatro fatores de produção e quatro rendas nacionais. As entidades são: pessoas, empresas, governo e resto do mundo. Os fatores de produção são: recursos naturais, trabalho, capital e iniciativa empresarial. As rendas nacionais são: arrendamento (dos recursos naturais), salários, juros e lucros.

Afirma-se que cada uma dessas rendas é resultado do preço a elas aplicado. Arrendamento resulta do preço dos recursos da natureza; salário é a remuneração do trabalho humano; juros são a remuneração do capital; e lucro é a paga da iniciativa empresarial. Essa introdução é necessária para o entendimento de que “juro” é uma espécie de “preço”, nos termos da definição geral de preços, e decorre de toda renda ou disponibilidade monetária não consumida no presente, mas aplicada em algum meio de consumo futuro. Quando um trabalhador decide aplicar parte de seu salário em qualquer tipo de ativo, ele está adiando o direito de consumir no presente os bens, serviços e ativos que aquela parcela de seu salário consegue comprar; logo, ao entregar seus recursos a alguma entidade econômica daquelas listadas acima (geralmente usando o sistema financeiro para isso), ele recebe uma recompensa chamada “juro”. Já a entidade econômica a quem o dinheiro poupado é emprestado paga pelo uso de recursos que não são seus, e isso é o que acontece com o governo que, ao gastar mais do que arrecada, toma dinheiro emprestado vendendo seus títulos públicos.

A inflação brasileira, neste momento, não resulta de excesso de demanda; é uma inflação derivada de vários problemas simultâneos, como a crise hídrica, a elevação da taxa de câmbio e a subida dos preços do petróleo

A porcentagem que o governo brasileiro paga a quem lhe empresta dinheiro comprando seus títulos é a taxa Selic. Mas o governo pode lançar títulos no mercado mesmo que ele não tenha necessidade daquele dinheiro, como um meio de retirar recursos financeiros do mercado a fim de “esfriar” o consumo ou outras demandas. Ou seja, se o Banco Central (BC) percebe que há mais demanda de consumo do que a produção nacional consegue atender, ele pode retirar moeda do mercado oferecendo boas taxas de juros a quem poupar e comprar os títulos públicos. É nesse ponto que entra o poder da taxa de juros de, ao ser elevada, contribuir para reduzir a demanda excedente em relação à oferta, para evitar elevação dos preços. Seria a inflação de demanda.

O que tem sido crença mundial e prática de quase todos os bancos centrais é que há certa eficiência desse mecanismo dos juros para combater a inflação de demanda. Afora essa opção, é pequena a capacidade da taxa de juros em, quando aumentada, frear a inflação que exista movida por outras causas que não o excedente de demanda. Quando existe inflação, a elevação da taxa de juros tem mais outra função além de combater a elevação de preços, que é manter o poder de compra das poupanças, evitar a perda de patrimônio financeiro dos poupadores e manter o estímulo à poupança.

O mais recente aumento da taxa Selic, elevada para 7,75% ao ano, veio na esteira de surpreendente subida da taxa de inflação que, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), chegou a 10,25% no acumulado de 12 meses em setembro de 2021. A inflação brasileira, neste momento, não resulta de excesso de demanda; pelo contrário, a demanda foi reduzida em função da pandemia e seus efeitos, como aumento do desemprego, redução de renda do trabalho e queda do consumo. É uma inflação derivada de vários problemas simultâneos: crise hídrica, aumento dos preços de energia, elevação da taxa de câmbio, subida dos preços do petróleo, aumento dos preços dos combustíveis e gás.

A inflação brasileira atual tem mais componentes de custos que componentes de demanda, e foi agravada pelo aumento de preços nos monopólios estatais (caso dos combustíveis, que têm parte da cadeia monopolizada na prática, e da energia, que é monopólio natural). Preços de produtos vendidos por monopólios, sejam públicos ou privados, não são passíveis de controle via aumento da taxa de juros, principalmente porque, em grande parte, os produtos que eles ofertam são necessários e não têm sucedâneo, como é o caso da gasolina, óleo diesel, gás, energia, água e esgoto. Adicione-se que esses produtos têm significativo peso ponderado no cálculo da inflação.

Assim, a elevação da Selic parece mais destinada a compensar os poupadores pela elevação nas taxas de inflação e evitar a queda de aplicações financeiras que ocorre quando as taxas de juros ficam abaixo da inflação (vale lembrar que a Selic de 7,75% e o IPCA de 10,25% ainda significam substancial perda para os portadores de ativos financeiros), e só secundariamente o aumento dos juros tem capacidade de deter o processo inflacionário.

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