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Editorial

A saída de dólares e a irresponsabilidade fiscal

Saída de dólares
Fluxo financeiro está registrando recordes em termos de saída de dólares. (Foto: Foto-RaBe/Pixabay)

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Com os números consolidados de dezembro e do ano de 2024 ainda por divulgar, já é praticamente certo que estamos diante de dois recordes históricos: a pior fuga de dólares do país pelo fluxo financeiro – que considera operações no mercado financeiro, remessa de lucros, pagamento de juros e investimento direto – tanto em um único mês quanto em um ano. Os US$ 26 bilhões retirados do Brasil até 27 de dezembro superam de longe o pior fluxo financeiro de um mês na série histórica, os US$ 20,4 bilhões de dezembro de 2009. Além disso, em 2024, até o mesmo dia 27 de dezembro, a saída de dólares pelo fluxo financeiro era de R$ 84,4 bilhões, superando a pior marca anterior, de 2019, com saída de US$ 65,8 bilhões.

Os dados preliminares divulgados pelo Banco Central no dia 2 de janeiro ainda apontam para o pior mês em termos de saída de dólares do país no fluxo cambial – que compreende o fluxo financeiro e a balança comercial. Considerando as entradas de US$ 1,7 bilhão pelo comércio exterior, o fluxo cambial de dezembro, até o dia 27, registrava saída de US$ 24,3 bilhões, a pior desde que os dados começaram a ser compilados, em 2008. Ainda em relação ao fluxo cambial, 2024 está a caminho de ser o terceiro pior ano da série histórica, com saída líquida de US$ 15,9 bilhões até 27 de dezembro, uma fuga de dólares inferior apenas às registradas em 2019 (US$ 44,77 bilhões) e 2020 (US$ 27,9 bilhões). Isso apesar de balança comercial estar rumando para um dos melhores resultados da série histórica, com superávit de quase US$ 68,5 bilhões.

A desconfiança e a aversão ao risco tomaram conta do mercado financeiro – e haja risco, quando se trata de Lula, do PT e mesmo de Fernando Haddad

Há um fator sazonal no resultado: dezembro tradicionalmente é um mês de fluxo financeiro negativo graças ao fechamento dos balanços de empresas multinacionais, com remessas de dólares das filiais brasileiras para as matrizes no exterior. No entanto, os números deste dezembro de 2024, bem como o do acumulado do ano, têm destoado da média, e não há como atribuir a diferença apenas a movimentos novos, como o investimento em criptoativos e o pagamento de “serviços recreativos” (rubrica que inclui desde sites de apostas, as “bets”, até os streamings). A desconfiança e a aversão ao risco tomaram conta do mercado financeiro – e haja risco, quando se trata de Lula, do PT e mesmo de Fernando Haddad, que é saudado hoje como uma ilha de responsabilidade não porque tenha ideias realmente boas para a economia, mas porque seu entorno é muito mais inconsequente.

Ao longo dos quatro primeiros meses de 2024, o dólar oscilou na casa dos R$ 5. Bastou que, em abril, o governo alterasse as metas de resultado primário que ele mesmo havia proposto em 2023, quando o arcabouço fiscal foi aprovado no Congresso, para que o real entrasse em um ciclo gradual, mas consistente, de desvalorização. A disparada das últimas semanas teve como estopim o anúncio de um pacote fiscal completamente pífio e incapaz de reverter a trajetória de aumento no gasto público. Embora o dólar tenha se fortalecido diante da maioria das moedas em todo o mundo, o real termina o ano com a maior desvalorização entre as moedas mais negociadas no planeta.

A ausência de medidas de ajuste fiscal sólidas e eficazes, tendo como consequência mais inflação e crescimento da dúvida pública, aumenta a possibilidade de que nem mesmo as prometidas futuras elevações na Selic, elevando a diferença entre os juros pagos no Brasil e os juros pagos nos Estados Unidos, sejam capazes de reverter a saída de dólares. Novos resultados negativos nos primeiros meses de 2025 serão a comprovação definitiva de que os números de dezembro não podem ser explicados única e exclusivamente pelos elementos sazonais de todo fim de ano. O governo já perdeu muito tempo insistindo em não perceber nem retificar os erros, e ao que tudo indica continuará vendo a saída de capitais, sem crer que ele é o principal responsável pela debandada.

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