O Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros, a Selic, para 12,5% ao ano. Novamente surgiu a gritaria contra "as mais altas taxas de juros do mundo". Tem sido persistente a afirmação de que o Brasil tem taxa de juros altíssima. Essa generalização contém um equívoco. A taxa de 12,5% é alta, mas essa é apenas a taxa nominal que, quando comparada com taxas nominais de outros países, induz a erro. A comparação adequada deve ser feita considerando-se a taxa de juros real líquida, o que implica considerar a inflação e os tributos cobrados pelo governo sobre os rendimentos financeiros.
No Brasil, o Imposto de Renda sobre os juros chega a 20%, o que significa menos 2,5% para quem aplica em títulos públicos indexados à Selic, deixando, para o investidor, uma taxa de ganho líquida de 10% ao ano. A nova taxa de 12,5% será aplicada aos títulos públicos novos que o governo vier a emitir, portanto, dos 10% de juros líquidos de impostos, deve ser deduzida a inflação futura. Se a inflação chegar a 7%, a taxa real de juros ficará em 3% ao ano, o que não é, de forma alguma, uma taxa estratosférica, sobretudo em um país que precisa aumentar a taxa nacional de poupança.
O que motivou o Copom a elevar a taxa básica foi a inflação ascendente. A meta de inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de 4,5%, mas o índice já está superando os 6,6% e os sinais dos últimos meses estão indicando que poderá continuar subindo e bater nos 7% ao ano. É o receio de que a elevação de preços possa fugir do controle que levou o Copom a elevar os juros. Nesse cenário, há um aspecto problemático do ponto de vista social: em 2010, o IPCA encerrou o ano em 5,91%, mas os alimentos subiram 10,4%. Esse indicador é especialmente importante para definir o padrão de bem-estar da população de menor renda e, ao ficar acima do IPCA, gera estragos na renda familiar e queda na popularidade do governo.
O Banco Central (BC) resolveu reagir e sinalizou que pode voltar a elevar a taxa Selic, sobretudo porque o governo já deu indicações que não fará a sua parte, ou seja, não haverá redução nos gastos públicos. Os déficits do governo representam uma das principais causas de inflação e, a esse respeito, a presidente Dilma Rousseff deu uma declaração estranha e ambígua. Ela afirmou que o governo optou por manter "a economia crescendo de forma consistente e que uma política de convergência de curtíssimo prazo teria um efeito danoso para a economia". E acrescentou: "Estamos fazendo o chamado pouso suave, com uma taxa de crescimento e de emprego adequadas para o país".
Com esse tipo de declaração, a presidente contribuiu para espalhar mais dúvida que esclarecimento sobre a real intenção do governo, quando em março passado a presidente havia declarado ao jornal Valor Econômico que "não vou permitir que a inflação volte no Brasil. Não permitirei que a inflação, sob qualquer circunstância, volte". Nesse panorama todo, há outro elemento preocupante: a inflação subiu ao mesmo tempo em que a taxa de câmbio caiu e manteve baixos os preços em reais dos produtos importados. Isso significa que, se o preço do dólar subisse junto com a inflação, os preços das importações teriam subido jogando o IPCA para níveis mais altos ainda. Ou seja, a atual inflação é resultado de problemas na economia interna e não de fatores externos. O único fator externo que já produziu seus efeitos foi a elevação dos preços mundiais das commodities, que já pararam de subir na velocidade em que vinham subindo nos últimos anos.
A questão é saber se a elevação da taxa Selic será eficiente para conter a inflação. As taxas de juros para as empresas e para os consumidores são altíssimas há muito tempo. Se a elevação da Selic provocar aumento dos juros para os consumidores pode haver alguma redução na demanda das pessoas, o que contribuiria para diminuir a pressão da demanda sobre a oferta. O problema é que esse mesmo efeito pode ocorrer sobre os financiamentos para capital de giro das empresas, o que encarece o custo de produção e desestimula a expansão da oferta. Quando isso ocorre, há queda no consumo e queda na produção, de forma que um efeito anula o outro e a inflação não é pressionada para baixo.
Esses detalhes todos revelam a complexidade das entranhas da política econômica e mostram que a melhor medida é a que o governo se recusa a tomar: o equilíbrio das contas públicas, pela redução do déficit público nominal nas três esferas de poder (municipal, estadual e federal). A coexistência de inflação baixa com déficits públicos elevados pode ocorrer em períodos curtos, mas é impossível manter-se em períodos prolongados. Essa é a lição que a sociedade brasileira tem de entender, e os políticos têm de abraçar, caso o país queira preservar em caráter permanente a conquista maior do Plano Real, que é o fim da inflação.