Os atos públicos que mobilizaram milhares de pessoas ontem em todo o Paraná inauguraram uma nova etapa na relação entre os políticos eleitos e os cidadãos paranaenses. A sociedade mostrou que não vai aceitar que os deputados estaduais e dirigentes partidários continuem omissos ou coniventes com práticas espúrias na Assembleia Legislativa. Entretanto, o caminho para a moralização do Poder Legislativo paranaense está apenas começando. Por mais que haja obstáculos, sejam jurídicos ou políticos, não desistiremos.
O momento agora é da disseminação da sede pela transparência. Como bem declarou o presidente da Associação dos Juízes Federais do Paraná (Apajufe), Anderson Furlan, durante a manifestação de ontem na Boca Maldita, em Curitiba, "não há um paranaense que seja contra a transparência, a não ser aqueles que se beneficiam dela para tirar proveito próprio". Todo paranaense consciente dos benefícios que uma sociedade vigilante pode trazer tem o poder, e até o dever, de produzir um efeito multiplicador para que todos os cidadãos façam boas escolhas políticas. Isso significa não só ficar atento aos próximos acontecimentos, mas também exigir uma posição clara dos parlamentares eleitos e, sobretudo, se preparar para um voto consciente.
A sociedade mostrou ontem que não vai ficar inerte. Se os deputados estaduais apostavam na memória curta da população, ou no comodismo, erraram. Muitos acreditavam que uns poucos gatos pingados desafiariam o frio e apareceriam nos atos públicos de ontem. A resposta veio na voz da multidão que, aos milhares, pediu o afastamento da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa.
As manifestações de ontem precisam ser encaradas como o prenúncio de algo maior. Foi assim na Campanha das Diretas, em 12 de janeiro de 1984 quando o Paraná iniciou a era das grandes mobilizações na mesma Boca Maldita. De lá para cá, a cidadania só vem se aprimorando. Em tempos que as facilidades tecnológicas poderia nos distanciar das questões políticas, as redes sociais tiveram o papel inverso e contribuíram para a mobilização dos paranaenses.
Ontem os cidadãos mostraram que, mobilizados, tem força política suficiente para dizer não à impunidade. Não mais toleram omissões ou conivências em esquemas monstruosos de desvio de recursos públicos, como o que ocorreu na Assembléia Legislativa. Não mais toleram um Poder Legislativo fechado, voltado para os interesses pessoais dos deputados. Mostraram que o Poder Legislativo precisa voltar a expressar a vontade da sociedade. Afinal, são os interesses dessa sociedade que devem ser defendidos.
Os paranaenses expressaram sua vontade política. Mostraram ser cidadãos pacíficos, mas não passivos ou acomodados. Se os deputados estavam confiando na "memória curta" do eleitor, na passividade como regra política, se enganaram. Ontem, tínhamos a alternativa de permanecermos escondidos em nossas casas. Mas, assim, estaríamos corroborando com todos os crimes e ilegalidades praticados na Casa do Povo. Estaríamos legitimando os desmandos feitos com o dinheiro público.
Neste momento em que tantas entidades se unem e nos chamam a dar a nossa contribuição para o bem comum, o silêncio não é uma escolha. Silenciar é contribuir para o fortalecimento de duas classes de pessoas. De um lado, pessoas que acreditam estar acima das leis e das instituições. Pessoas que tratam a coisa pública como privada e que apostam sempre no esquecimento e na impunidade. De outro, pessoas "comuns" que se satisfazem apenas com o momento do voto e que, por isso mesmo, acreditam que nada mais possa ou deva ser feito. Pessoas conformadas com a corrupção e com a ineficiência dos Poderes e das instituições.
Não é o que desejamos. Podemos fazer diferente. Acreditamos na possibilidade de fortalecimento de uma terceira classe de pessoas: a classe dos cidadãos. Uma classe formada por pessoas que cumprem com suas obrigações familiares e profissionais, mas que, ao mesmo tempo, encontram-se também atentas para as questões de interesse da sociedade em que vivem. Pessoas preocupadas com a coisa pública e com o bem comum. Acreditamos na cidadania e no exercício diário da democracia.
Três meses de denúncias e um Poder Legislativo inerte diante delas foi o suficiente para a emergência da indignação dos cidadãos de nosso estado. Ontem, a população mostrou que o Paraná que queremos é muito diferente daquele estimado por nossos representantes eleitos. Diante da vontade política manifestada da população, espera-se que ela seja respeitada por aqueles que, a cada dia, perdem mais o seu direito de permanecerem como representantes na Casa do Povo. A mobilização de ontem lembrou que apesar dos escândalos que vêm ocorrendo na Assembleia Legislativa, a população ainda pode se sentir orgulhosa de ser paranaense.
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