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O surto populista que voltou a grassar na América Latina acaba de fazer do Brasil a sua maior vítima. Ironicamente, nosso país prova agora do veneno que, direta ou indiretamente, foi gestado pelos alquimistas da estranha política externa que passou a vigorar no governo Lula. A nacionalização dos campos de petróleo e de gás natural explorados pela Petrobrás e a humilhante ocupação de suas instalações pelo exército boliviano não são outra coisa senão o resultado dessa política.

Prestigiado durante a campanha que o levou à presidência da Bolívia e tratado sempre com afagos incomuns, Evo Morales nunca escondeu suas intenções. Já faziam parte de sua pregação eleitoral; e não as negou nem mesmo quando, logo em sua primeira visita a Brasília, foi solenemente recebido pelo presidente Lula. Depois disso, tornaram-se cada vez mais evidentes os sinais de que perpetraria a expropriação do patrimônio brasileiro e romperia as bases dos contratos que seu país firmou com o Brasil.

Tais sinais sempre foram irresponsavelmente ignorados pelo governo brasileiro. Não tiveram, em nenhuma ocasião, resposta firme. Não se viu nenhuma reação em defesa dos investimentos superiores a US$ 1 bilhão realizados pela Petrobrás e nem, muito menos, se exigiram garantias de que não seria interrompido o abastecimento de gás – hoje a mais importante matriz energética que mantém em funcionamento a indústria nacional.

A leniência brasileira se explica pelo viés igualmente populista e nacionaleiro que inspira o próprio governo Lula, cuja origem se encontra no esquerdismo ideologicamente obsoleto que serviu de berço para o surgimento do Partido dos Trabalhadores. Embalada nesta visão ultrapassada e no afã de conquistar liderança e admiração do Terceiro Mundo, a política externa de Lula voltou-se para o prestigiamento dos governos vizinhos de mesmo viés.

E no afã, também, de conquistar-lhes votos para a almejada ambição brasileira de ocupar um posto permanente no Conselho de Segurança da ONU e a presidência da Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo brasileiro passou a fazer-lhes concessões – que se revelaram inócuas, pois que o país não conseguiu nenhuma das posições. Agrados foram distribuídos à Argentina do neoperonista Néstor Kirchner e à Venezuela do coronel Hugo Chávez. Ensaia-se agora também apoio ao igualmente nacional-populista candidato à presidência peruana Ollanta Humala.

Como resultado desta ação, o Mercosul se inviabilizou. Acabou, na semana passada, de receber seu mais duro golpe, com a saída do bloco de seu parceiro-fundador, o Uruguai. E perdeu-se também a tal da liderança continental, hoje nas mãos ambiciosas e recheadas de petrodólares de Hugo Chávez. Em suma, o Brasil deixou de ser levado a sério por seus vizinhos – e agora é também atropelado em seus interesses e direitos.

Criamos, pois, nos últimos três anos, as condições políticas necessárias para que prosperassem ao nosso redor regimes de franca oposição às tendências mais modernas – inclusive as de esquerda, como se nota nos oásis de socialismo esclarecido vigentes no Chile e, mais recentemente (até prova em contrário), no Uruguai. Nossa alquimia diplomática, em resumo, tem contribuído para o atraso.

E o atraso que indiretamente patrocinou e apoiou volta-se agora contra o Brasil. Ensinam as grandes escolas de diplomacia que países não têm amigos; têm interesses. Perdemos os "amigos" e prejudicamos nossos interesses.

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