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Editorial 1

Acordo nuclear da dúvida

O acordo nuclear entre Brasil, Tur­­quia e Irã era certo. Nem por isso o pacto pode ser considerado um marco nas negociações sobre o controverso programa nuclear de Teerã. Isso porque, nitidamente, a intervenção brasileira foi feita com o objetivo de fazer o Irã ganhar tempo e afastar o imediato risco de sanções por parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU).

Há quem considere que, ainda assim, o acordo represente uma vitória da eficiência da diplomacia brasileira. De fato, Lula conseguiu rapidamente a anuência do presidente Mahmoud Ahmadinejad. Mas, vista de outro ângulo, essa velocidade é indicadora de uma proximidade que dá a medida da linha que segue o Itamaraty. Nosso governo tem trânsito livre com regimes difíceis, marcados pelo autoritarismo e pelo desrespeito às regras do jogo internacional. Ahmadinejad é um exemplo. Chávez e Morales são outros. Será que esse acesso realmente indica nossa eficiência diplomática? Com todo o respeito aos que percebem valor no modelo, pensamos que não. O desembaraço não é um conceito absoluto que prescinda da liberdade, da democracia e de outros valores caros à diplomacia brasileira.

Um porta-voz do governo israelense afirmou que o Brasil e a Turquia podem ter sido "enganados" pelo Irã. Não parece ser esse o caso. O que se deu foi um bate-bola com vitórias para os dois principais envolvidos. Do modo como se desenhou, o acordo mais parece um jogo de cartas marcadas em que o iraniano deu a Lula uma oportunidade de brilhar como grande negociador no cenário internacional. O presidente brasileiro, por sua parte, brindou o iraniano com uma "saída honrosa" em um caso considerado perdido: o Irã tinha fechado todas as portas do diálogo e as novas sanções da ONU eram iminentes. Mas há derrotados. Saíram perdendo os que defendem a liberdade e o respeito aos acordos internacionais. Talvez por isso os EUA tenham manifestado sérias dúvidas quanto ao comprometimento iraniano para cumprir o acordo. Afinal, nem Ahmadinejad mudou tão radicalmente de opinião, nem Lula tem poder tão grande de argumentação. São óbvios os interesses políticos embutidos em todo o processo. Não por acaso, o presidente da Rússia, Dimitri Medveded, resumiu os receios da comunidade internacional a esse respeito afirmando que se trata de um acordo que deixa muitas questões sem respostas. Entre elas as que dizem respeito a questões políticas e posicionamentos radicais do iraniano, especialmente quanto a Israel.

A diferença deste momento em relação a outubro, quando um pacto de termos semelhantes foi recusado por Ahmadinejad, é que, agora, se o Irã declinasse do acordo, perderia a confiança do Brasil e da Turquia, os grandes aliados políticos que lhe restam. Nessa hipótese, o governo de Teerã ficaria completamente isolado no cenário político internacional. E poderia sofrer sanções ainda mais duras, tendo contra si os votos do Brasil e da Turquia – integrantes temporários no Conselho de Segurança da ONU e emergentes com credibilidade por não disporem de arsenal atômico. Ahmadinejad levou tudo isso em conta. Lula, a tomar a frente das ne­­gociações, também.

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