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Editorial

Aborto no STF não pode ter “julgamento silencioso”

Supremo Tribunal Federal, o STF, gostar de fazer acrobacias jurídicas de vez em quando, como no caso do passaporte vacinal.
A estátua da Justiça diante do prédio do Supremo Tribunal Federal. (Foto: Rosinei Coutinho/STF)

Seis anos e meio depois de ter sido protocolada, a ADPF 442, a ação que pretende legalizar o aborto no Brasil, por qualquer motivo, até a 12.ª semana de gestação, irá a julgamento no Supremo Tribunal Federal. A decisão era, de certa forma, esperada: a ministra Rosa Weber, que, na qualidade de presidente da corte, define sua pauta, completa 75 anos em 2 de outubro e não deixaria o Supremo sem antes dar seu voto, tido como certo a favor da ação. Não se esperava, no entanto, que ela optasse pelo plenário virtual para o julgamento – neste formato, não há discussão ou argumentação acessível a todo o povo brasileiro por meio da TV Justiça, mas apenas o depósito dos votos no sistema informatizado da corte.

Podemos chamar a ADPF 442, com toda a tranquilidade, de um processo viciado – não do ponto de vista legal, mas do ponto de vista moral. A ação começou quando um partido político, o PSol, negou sua própria razão de ser – a conquista de apoio popular às suas plataformas, refletida em uma bancada numerosa a ponto de influenciar os trabalhos legislativos – para buscar no Judiciário a forma de impor as convicções que não é capaz de fazer avançar no Congresso. As audiências públicas promovidas pela corte foram desequilibradas, com maioria nítida favorável à posição pró-aborto; além disso, quase todas as entidades ou indivíduos defensores da vida escolhidos para se manifestar tinham alguma vinculação religiosa, em uma tentativa evidente de fazer do posicionamento pró-vida uma postura exclusivamente ligada à fé, como se o aborto fosse uma “discussão religiosa” e não um debate ético-filosófico, antropológico, médico e científico.

O Supremo, se aprovar a legalização do aborto no Brasil, terá dado um verdadeiro golpe

Independentemente das razões de Rosa Weber para ter escolhido o plenário virtual, o fato é que o povo brasileiro não pode ser impedido de presenciar todos os detalhes do debate final a ser travado no Supremo. O plenário virtual não é algo equivocado em si, e oferece certa praticidade que ajuda a desafogar um STF repleto de processos a julgar. Mas um assunto como este, em que está em jogo – literalmente – a vida de sabe-se lá quantos milhares de vidas humanas, jamais deveria ser julgado por este meio. O mínimo que se espera é que um dos demais ministros apresente um pedido de destaque, que automaticamente interrompe o julgamento em plenário virtual e o leva para as sessões presenciais, recomeçando tudo do início – neste caso, preserva-se apenas o voto de Rosa Weber, que já terá se aposentado e não poderá mais participar do julgamento.

E, diante do olhar de um país inteiro, que tenhamos ministros com a coragem de atestar as muitas obviedades em torno deste assunto. Que o aborto é barbárie, a eliminação de um ser humano indefeso e inocente. Que a vida é um direito constitucionalmente garantido, e que não existe nenhum “direito de matar o próprio filho”, muito menos amparado em teorias sobre o “direito da mulher ao próprio corpo”, já que o nascituro é um outro indivíduo, que surge no momento do encontro dos gametas, e não em algum passe de mágica ocorrido no primeiro dia da 13.ª semana de gestação. E, finalmente, que este é assunto que cabe única e exclusivamente ao Poder Legislativo, e não ao Poder Judiciário – e nem se pode dizer que haja omissão do Congresso quanto a este assunto, já que os legisladores, representantes do povo, já se pronunciaram em diversas oportunidades sobre inúmeros projetos de lei que tratam do aborto.

Em sua nota a respeito da ADPF 442, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil usou a expressão “pauta antidemocrática”, e acerta em cheio na escolha das palavras. O Supremo, se aprovar a legalização do aborto no Brasil, terá dado um verdadeiro golpe, no qual alguns poucos ministros, considerando-se os reis-filósofos do século 21, fazem sua opinião se sobrepor à Constituição, às leis infraconstitucionais, ao princípio da separação de poderes e às convicções de ampla maioria da população brasileira, reafirmadas por inúmeras pesquisas de opinião. Essa atitude não seria aceitável de forma alguma, nem mesmo se tal opinião fosse a perfeita manifestação da verdade, do bem e da justiça; muito menos o será quando se trata de um retrocesso civilizatório de enormes proporções.

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