A mais longa greve do transporte coletivo na história recente de Curitiba terminou nesta quarta-feira, com o entendimento entre o Sindimoc, que representa os trabalhadores, e o Setransp, o sindicato das empresas de transporte coletivo. Antes mesmo do acordo, já vigorava uma “trégua”, com motoristas e cobradores anunciando que trabalhariam normalmente, colocando nas ruas 100% da frota que deveria circular caso não houvesse paralisação.
Não nos cabe, agora, analisar os termos específicos do acerto entre trabalhadores e patrões. Mas é preciso chamar a atenção para as consequências que uma paralisação tão longa teve para a população curitibana, que já havia sido surpreendida com um reajuste de 55 centavos no início de fevereiro, antes mesmo que fosse determinada a tarifa técnica, parâmetro que costuma orientar as definições sobre o preço cobrado do usuário pela passagem. Antes da batida de martelo sobre o reajuste dos funcionários, a tarifa técnica era de R$ 3,66, ou seja, os passageiros que vinham pagando passagem desde fevereiro estavam subsidiando o sistema com R$ 0,59. Essa diferença, afirma a prefeitura, vai para o Fundo de Urbanização de Curitiba (FUC), com o objetivo de “renovar a frota existente e ainda aumentá-la”, de acordo com o que escreveu o prefeito Rafael Greca em 20 de março, em seu perfil no Facebook.
Os curitibanos já tinham sido surpreendidos com um reajuste de 55 centavos na passagem em fevereiro
Em janeiro, a Gazeta do Povo mostrou que há 404 ônibus com mais de dez anos rodando pela cidade, quando já deveriam ter sido substituídos; e a idade média da frota está em sete anos, quando o contrato de concessão determina um máximo de cinco anos. A renovação não ocorre porque as empresas conseguiram, em 2013, uma liminar que as dispensava de comprar novos ônibus. “A renovação da frota ainda não começou porque Curitiba precisa que as empresas desistam das ações contra a prefeitura”, escreveu Greca na mesma ocasião. Essa queda de braço indica que já está em curso, no caso do transporte coletivo da capital, um processo de judicialização que, se não for interrompido em breve, poderá acabar como o atual impasse sobre os pedágios paranaenses, que chegou a um ponto no qual é quase impossível saber exatamente que regras estão valendo e quem tem razão.
Prejudicada cotidianamente ao viajar em veículos que quebram com mais frequência, sofrendo com atrasos e ônibus lotados, a população foi a grande vítima da queda de braço entre trabalhadores e empresas. Não é por outro motivo que a Justiça do Trabalho havia determinado porcentagens mínimas da frota que deveriam continuar circulando mesmo durante a paralisação – 50% nos horários de pico e 40% fora deles. Alegando que essas porcentagens teriam pouco impacto sobre os patrões, o Sindimoc chegou a procurar baixá-las, mostrando insensibilidade ao drama do cidadão que depende do transporte coletivo. O recurso foi negado e, de acordo com os dados da Urbs, o sindicato não vinha seguindo as determinações judiciais por boa parte da duração da greve, ignorando o preceito básico segundo o qual decisão judicial é para ser cumprida – o Sindimoc, no entanto, contesta as informações da Urbs.
A aplicação de multas tem antecedentes. Em 2015, ambos os sindicatos foram multados em R$ 200 mil por descumprimento de frota mínima, mas recursos baixaram o valor para R$ 100 mil. O Setransp demonstrou que não tinha culpa e teve a multa extinta, enquanto o Sindimoc aguarda julgamento de recurso no Tribunal Superior do Trabalho. Em 2011, o Sindimoc pagou multa de R$ 40 mil. Os valores em jogo agora são bem superiores – R$ 100 mil por hora de descumprimento, o que pode resultar em uma multa milionária. Uma punição muito desproporcional será inevitavelmente reduzida, mas uma quantia baixa demais estimulará a repetição desse comportamento no futuro, novamente punindo a população.
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