Quando o mundo atingiu 1 bilhão de habitantes, em 1830, houve amplo debate sobre a capacidade mundial de produzir alimentos para uma população sempre crescente. As discussões foram estimuladas por uma obra do economista inglês Thomas Robert Malthus (1766-1834) intitulada Ensaio sobre o Princípio da População, publicada em 1798, na qual ele analisava os problemas ligados ao crescimento demográfico. A teoria malthusiana, como a obra passou a ser conhecida, tinha por base a constatação de que a população cresce em progressão geométrica, dada a facilidade de reprodução humana, enquanto a produção de alimentos cresce em progressão aritmética, pois depende da terra, insumos, tecnologia, máquinas e trabalho.
A expressão matemática na formulação de Malthus parecia assustar, pois o mundo, que levara 1.830 anos para chegar ao primeiro bilhão de habitantes, dobrou a população em apenas 100 anos (2 bilhões em 1930); em apenas mais 30 anos cresceu outro bilhão (3 bilhões de habitantes em 1960); na sequência foram apenas 15 anos para a população aumentar mais 1 bilhão (atingiu 4 bilhões em 1975); neste fim de 2020, o planeta está com 7,8 bilhões de habitantes, caminhando para, conforme previsões oficiais, chegar em torno de 9,5 bilhões em 2050. No todo, em apenas 220 anos – de 1830 a 2050 – a população terá saído de 1 bilhão para 9,5 bilhões, e isso revela a progressão geométrica de Malthus.
Qualquer que seja o rumo do crescimento econômico e do aumento populacional, a produção alimentícia no mundo terá de ser aumentada para atender à demanda global, oferecendo inúmeras oportunidades ao Brasil
O ponto essencial da pesquisa e da obra de Malthus é a constatação de que a população cresceria em velocidade muito maior que a velocidade do aumento da produção de alimentos. A avaliação da obra de um cientista ou pensador em geral deve levar em conta o contexto histórico no qual ela foi escrita e as condições vigentes no momento da pesquisa e suas conclusões. Uma obra ou uma ideia, mesmo quando pareça absurda, produz o efeito benéfico de levar a humanidade a debater e examinar o problema, mesmo porque não se sabe o quanto determinada previsão pessimista deixa de ocorrer justamente por decorrência de sua própria elaboração e publicação, que acabam levando a correções de rumo executadas pelo fato de o assunto ter sido tratado.
A análise e a previsão de Malthus foram publicadas numa época em que os métodos de produção rural eram primários e as tecnologias eram praticamente primitivas. À época, não se sabia que nas décadas seguintes o mundo faria uma revolução tecnológica na agricultura, de forma a obter o enorme ganho de produtividade que a agricultura acabou por alcançar dali em diante. O exponencial crescimento da população (que estava acontecendo) e os dados reais daquele momento justificavam a previsão alarmista do famoso economista.
A teoria de Malthus e seus alertas de que a população iria crescer tanto a ponto de ser impossível produzir alimentos em quantidades suficientes para todas as pessoas no planeta ressurgiram nos anos 1960 em face da explosão demográfica em andamento. O enorme aumento populacional colocou de volta as ideias de Malthus, que, com as devidas adaptações, foram trazidas à discussão sob o título de teoria neomalthusiana, a qual passou a incorporar a preocupação com o crescimento populacional nos países do Terceiro Mundo, seguido de pobreza e desemprego.
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A tecnologia e a revolução nos métodos de produção de alimentos no mundo permitiram que o fantasma malthusiano ficasse um tanto esquecido, mas isso não significa que não haja razões para preocupação. A se concretizar a previsão de que a população chegará a 9,5 bilhões em 2050, haverá 1,7 bilhão de pessoas a mais que hoje; e, segundo alguns organismos internacionais, neste momento há pelo menos 730 milhões de pessoas com insuficiência alimentar no mundo e 2,8 bilhões de pobres. Caso o mundo consiga prosperar e reduzir a pobreza, o primeiro item de consumo a aumentar para essas pessoas é a alimentação, ainda que elas não padeçam de insuficiência alimentar grave.
Dentro desse quadro, o agronegócio brasileiro tem importante participação por ser um dos países do mundo que mais contribuíram e contribuem para o abastecimento de produtos alimentícios, por ter grande extensão territorial e por ser uma das regiões com maiores perspectivas de expansão da área plantada e da produção. Apesar da posição relevante do Brasil no comércio internacional de grãos e outros alimentos, o país teria muito a ganhar, sobretudo em termos de melhoria da renda per capita nacional, se avançasse também na industrialização de suas matérias-primas e incorporasse etapas adicionais no processo de transformação, a fim de aumentar o valor agregado dos produtos exportados. Qualquer que seja o rumo do crescimento econômico e do aumento populacional, a produção alimentícia no mundo terá de ser aumentada para atender à demanda global por alimentos, que seguirá crescendo.
Esse panorama deixa recados importantes para o governo e a sociedade brasileira: além da expansão da área plantada, do progresso tecnológico e do aumento da produtividade agropecuária, que o setor deve continuar conquistando, o país ainda não extirpou a ameaça do “custo Brasil”, principalmente em função de insuficiência de investimentos em infraestrutura de transportes, portos, armazenagem e energia, sem esquecer também da influência sobre a capacidade competitiva, exercida pela taxa de câmbio (que neste momento está favorável ao exportador), pela taxa de juros para o produtor e pela carga tributária. Se for competente, no âmbito estatal e no âmbito privado, o Brasil poderá aproveitar o cenário de crescimento populacional, redução da pobreza e necessidade mundial de aumentar a produção de alimentos, colocando-o a favor do projeto de fazer a nação subir para um patamar superior de crescimento da economia e desenvolvimento social.
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