Os defensores da ideologia de gênero encastelados nos órgãos que definem os rumos da educação no país, como o Conselho Nacional de Educação e o Ministério da Educação (MEC), viram na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) o caminho para implantar em todas as escolas no país os conceitos segundo os quais os fatores biológicos são menos importantes que as construções sociais na definição dos papéis masculino e feminino. A estratégia buscava contornar a indignação popular contra esta ideologia, e que levou casas legislativas nos três níveis de governo a rejeitar a inclusão de conteúdos de gênero nos planos Nacional, estaduais e municipais de Educação.
Com a BNCC perto de ser aprovada, parecia que os ideólogos estavam prestes a vencer a batalha. Em 1.º de dezembro, o secretário de Educação Básica do MEC, Rossieli Soares da Silva, havia dito à Gazeta do Povo que quaisquer mudanças nos conteúdos sobre gênero estava fora de questão. “Não tem discussão de mudança em relação a isso porque nós não entendemos que tinha ideologia de gênero, que tinha isso, que tinha aquilo. Tem respeito a todos”, afirmou Silva à reportagem.
A nova formulação tira das mãos dos ideólogos o poder de impor os enfoques que gostariam de levar à sala de aula
No entanto, segundo os jornais Folha de S.Paulo e O Globo, e apesar das afirmações de Silva, o governo demonstrou sensatez e elaborou uma nova – a quarta – versão da BNCC, em que foram removidas pelo menos dez menções a questões de gênero. Esta versão é a que deveria ter sido votada na sessão de quinta-feira passada do Conselho Nacional de Educação, mas um pedido de vista de três conselheiras interrompeu a análise; uma sessão extraordinária, marcada para esta semana, deve concluir a votação, dando alguns dias para que os conselheiros façam “uma leitura adequada” do documento, nas palavras de Márcia Ângela da Silva Aguiar, uma das autoras do pedido de vista.
Segundo a Folha de S.Paulo, a discussão sobre gênero foi deslocada, saindo das disciplinas onde constava na terceira versão da BNCC, como Artes ou História, para a disciplina de Ensino Religioso, alvo de uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal que validou o caráter confessional do conteúdo a ser oferecido em escolas públicas. As noções de “gênero e sexualidade” seriam discutidas de acordo com o que afirmam as várias religiões – por mais que isso desagrade aqueles que gostariam de ver as questões de gênero completamente eliminadas da BNCC, há de se reconhecer que a nova formulação, ao estabelecer como parâmetro da discussão as concepções de cada fé a respeito do assunto, tira das mãos dos ideólogos o poder de impor os enfoques que gostariam de levar aos alunos do ensino fundamental.
Mais uma vez, é preciso ressaltar que a escola tem, sim, papel importante ao reforçar em seus alunos o respeito a todo ser humano, independentemente de qualquer característica – respeito este que precisa vir de casa, mas que a escola tem a chance de ressaltar pelas oportunidades de convivência que proporciona. Nada disso, no entanto, inclui impor sobre as crianças e adolescentes teorias carentes de fundamentação científica e que, como demonstrou estudo recentemente traduzido e publicado pela Gazeta do Povo, têm mais potencial de causar estragos graves justamente entre os alunos dessas faixas etárias.