A pressão popular foi decisiva para que a ideologia de gênero – que coloca a biologia em segundo plano para postular que o gênero é uma construção social e que, em última instância, está sujeito à decisão do indivíduo – não fosse incluída no Plano Nacional de Educação, votado e aprovado pelo Congresso Nacional em 2014. Diante da derrota, os defensores dessa ideia dentro do Ministério da Educação (MEC) adotaram estratégia diferente: cederam no âmbito nacional, onde a discussão do PNE tinha muita visibilidade, e passaram a pressionar os estados e municípios, recomendando a ideologia de gênero como diretriz educativa nos planos estaduais e municipais de Educação, contando com mobilização mais fraca. Não foi o que houve: os cidadãos continuaram se manifestando, de forma que foram pouquíssimos os estados e municípios que acataram a recomendação em seus planos.
Mesmo assim, os defensores da ideologia de gênero entrincheirados no MEC não desistem, e colocaram diversas menções a ela na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que norteará parte dos currículos escolares nas redes pública e privada da educação básica assim que o texto for homologado pelo governo federal. O truque está no fato de que basta a aprovação do ministro da Educação para que a BNCC seja implantada em todo o país, sem maiores discussões – especialmente no Congresso, onde já se sabe que a ideologia de gênero não tem como prosperar.
Combater o preconceito é diferente de promover uma teoria controversa e carente de fundamentação científica
A versão mais recente da BNCC tem diversas menções a questões de gênero, especialmente nos conteúdos de artes – entre as habilidades recomendadas para estudantes de 1.º a 5.º ano, está “discutir as experiências corporais pessoais e coletivas desenvolvidas em aula, de modo a problematizar questões de gênero e corpo”; para alunos do 6.º ao 9.º ano, “refletir sobre as experiências corporais pessoais e coletivas desenvolvidas em aula ou vivenciadas em outros contextos, de modo a problematizar questões de gênero, corpo e sexualidade” (páginas 159 e 165). Nas diretrizes para o ensino de História, as questões de gênero são incluídas entre as temáticas que devem ganhar destaque (página 351).
Há outras menções a gênero na BNCC que se referem ao combate à discriminação. De fato, cada ser humano, portador de uma dignidade intrínseca, merece ser respeitado pelo que é. Isso, no entanto, é bem diferente de impor a escolas de todo o Brasil a promoção de uma teoria controversa e carente de fundamentação científica, que ainda por cima atropela as convicções morais de muitas famílias – é oportuno, aqui, lembrar o artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos, segundo a qual “Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções”. Nada disso, no entanto, importa aos ideólogos do MEC.
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Em um país que aparece sempre na rabeira dos rankings internacionais de habilidades básicas, como leitura e matemática, e em que quase quatro entre dez universitários não são capazes de compreender um texto complexo (quanto mais redigir um), a obsessão dos educadores com a ideologia de gênero é incompreensível. Não se trata, aqui, de criar uma falsa dicotomia, como se fosse preciso escolher entre ensinar uma coisa ou outra; o problema é bem diferente e está na inversão de prioridades, como se a salvação da educação nacional estivesse não na ênfase nas habilidades básicas que faltam a parte significativa dos nossos estudantes e sem as quais não temos como progredir, mas em uma pedagogia “lacradora” (para usar uma expressão tão ao gosto dos promotores da engenharia social) imposta uniformemente a todo o país.