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Com o barco econômico e político à deriva desde os primeiros dias de seu segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff está em busca de tábuas de salvação, recorrendo até mesmo à ajuda de outros náufragos. Semana passada, por exemplo, convidou os governadores para reunião no Palácio da Alvorada. Não fez distinção entre eles: petistas e tucanos, situação e oposição de todas as cores e siglas atenderam ao chamado para estender a mão à presidente tanto para socorrê-la como para pedir-lhe socorro. Como uma mão lava a outra, todos saíram aparentemente satisfeitos – embora não tenham garantido completamente a salvação diante das ondas agitadas que balançam a nau.

O apelo de Dilma aos governadores foi para que a ajudassem a conter a saraivada de “pautas-bomba” que, na mesma Praça dos Três Poderes, o presidente da Câmara Federal, deputado Eduardo Cunha, e o presidente do Senado, Renan Calheiros, ambos do aliado PMDB, disparam neste recomeço do ano legislativo. São projetos que colocam em risco o programa de ajuste fiscal encetado pelo governo, dentre os quais os que tratam de desonerações na folha salarial das empresas e do aumento das taxas de remuneração dos depósitos do Fundo de Garantia. Sem falar da criação de CPIs incômodas para o Planalto, como as que pretendem investigar empréstimos do BNDES e irregularidades nos fundos de pensão.

A permissão não deve ser encarada como uma panaceia infalível para suplantar a penúria orçamentária dos estados

Os governadores se dispuseram a fazer o possível para convencer as bancadas dos respectivos estados a não criar embaraços suplementares para a já fragilizada presidente, mas pediram algo em troca. No caso, a sanção de um projeto de lei que permita aos estados fazer uso de até 70% dos depósitos judiciais tributários e administrativos – montanhas de dinheiro sob custódia da Justiça e inacessíveis para os Executivos estaduais.

Os depósitos são resultado de pendências judiciais de ordem tributária ou administrativa envolvendo entes privados e estados e municípios. São tributários os depósitos decorrentes de ações movidas por contribuintes inconformados com os valores que lhes são cobrados e que recorrem à Justiça para obter devolução ou abatimento. Administrativos são os que envolvem outras causas controversas, como valores de desapropriações imobiliárias. Enquanto se aguarda o trânsito em julgado das ações – o que pode levar anos ou até décadas –, os valores recolhidos ficam retidos e administrados pelo Poder Judiciário. A prática, porém, mostra que cerca de 70% das causas são vencidas pelos fiscos estaduais ou municipais.

É a esta parcela que os governadores queriam ter acesso, mas dependiam de previsão legal federal. Tentativas de utilização desses recursos por meio de legislação estadual têm tido sua constitucionalidade questionada principalmente por iniciativa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e por outras instituições. O Paraná se inclui entre os estados que legislaram em causa própria e já se utilizaram de parte dos depósitos judiciais para engordar seus orçamentos.

A presidente Dilma, diante do próprio aperto e da necessidade de conquistar apoios, estendeu sua mão aos governadores prometendo-lhes sancionar o projeto de lei de autoria do senador tucano José Serra que abre a possibilidade para estados e municípios fazerem uso dos depósitos, mas com limitantes que os obrigarão a agir com extrema responsabilidade quanto à destinação dos recursos, que terão de obedecer a uma ordem – em primeiro lugar, por exemplo, virá o pagamento de precatórios e dívidas previdenciárias. A sanção, com alguns poucos vetos, veio nesta semana, tendo sido publicada no Diário Oficial de quinta-feira.

De fato, todo cuidado é pouco. O Rio Grande do Sul, por exemplo, já há anos legislou e lança mão de depósitos judiciais, mas nem por isso consegue resolver seus gravíssimos problemas de caixa. O estado encontra-se atualmente conflagrado em meio a uma greve geral do funcionalismo porque o governo nem sequer consegue honrar a folha salarial. Logo, a permissão não deve ser encarada como uma panaceia infalível para suplantar a penúria orçamentária em que vivem os estados – incapazes de fazer o mínimo que deles se espera, isto é, não gastarem mais do que arrecadam.

Vencida esta etapa de aparente boa convivência e recíprocas concessões, há de se acompanhar a partir de agora seus efeitos políticos. Afinal, tudo se fez com o objetivo principal de acalmar os ânimos e de construir escudos contra as bombas vindas do parlamento.

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